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Etnomídia Indígena_Roda de prosa com vozes históricas da comunicação indígena no Brasil

Etnomídia Indígena_Roda de prosa com vozes históricas da comunicação indígena no Brasil

Anápuàka TupinambáAnápuàka Tupinambá

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Gente, tá no ar! ***Etnomídia Indígena*** Uma roda de prosa com vozes históricas da comunicação indígena no Brasil! Um encontro lindo, histórico e com mulheres incríveis: * Mediação: Anápuàka M. Tupinambá Hã hã hãe > Andila Kaingang > Eliane Potiguara > Ângela Pappiani > Olinda Yawar Muniz Wanderley * Produção e edição: Raquel Carneiro

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This transcription is about a radio show called EtnoMídia Indígena in Brazil. The host discusses the history of indigenous communication and the importance of EtnoMídia Indígena as the first indigenous web radio in the country. Guests share their experiences of working in indigenous communication and the challenges they faced. They talk about the creation of the program "Índio" and its impact on indigenous communities. They also discuss the distribution of information through radio and the struggles they faced in keeping the program on air. The conversation highlights the importance of indigenous communication and the role it plays in preserving indigenous culture and advocating for indigenous rights. Na rádio Iandê, EtnoMídia Indígena, uma roda de prosa com vozes históricas da comunicação indígena no Brasil. A apresentação e mediação, Anapuaca Muniz Tupinambá Ranzanzãi. Gente, primeiro, muito obrigado por estar com vocês. É bom estar com vocês. Aqui é um bate-papo sobre a EtnoMídia Indígena. Estamos trazendo diretamente da página da rádio Iandê, a primeira EtnoMídia Indígena do Brasil, a primeira rádio web indígena, independente do conceito, também somos a primeira. Isso nos coloca em uma condição hoje de ser grandes pesquisadores sobre a área e de pessoas muito importantes. Estamos aqui hoje, presente conosco, Andilha Caingang, Angela Papiani, Olinda Iauar Tupinambá, a Elaise, que sou hiperfã também desse setor, desse território imenso que ela acompanha junto com a gente, Eliane Potiguara e a minha amada querida também, Raquel Carneiro, que está junto com a gente, vai estar acompanhando. Ela é rostra, mas também vai estar interferindo, vai estar apontando junto conosco nesse bate-papo sobre a EtnoMídia nesse dia 12 de outubro de 2022, para alguns dias de Nossa Senhora Aparecida, para outro dia das crianças, dia das mulheres indígenas e isso é muito importante para todos nós. Boa tarde, pessoal, como é que vocês estão? Bem, estou bem. Muito bom. Estamos ótimas. Ótimas. Então, a gente tem um bate-papo aqui e uma das questões muito importantes é saber sobre a história da EtnoMídia, sobre a história da comunicação indígena, da comunicação de meio ambiente, de direitos humanos, que cada um de vocês, de alguma forma, passaram e iniciaram o processo. Pode até não ter sido etno-mediático, mas de alguma forma os povos indígenas, o meio ambiente, os direitos humanos sempre estiveram na vida de vocês. Eu conheço todas vocês de alguma forma, ou seja, remotamente, ou presencialmente, ou historicamente, e a minha origem comunicacional, ela nasce, por incrível que pareça, com cada um de vocês. Cada um tem a sua participação pessoal na minha história de vida comunicacional e eu gostaria muito de conhecer a história de vocês, a história da comunicação com os povos indígenas e para os povos indígenas que vocês constituíram na vida de vocês. Eu quero convidar a Ângela Papiani como uma das primeiras, até porque quando falo de Rá-Di-Andê, de comunicação indígena, eu não perco a oportunidade de falar da fonte límpida, da água límpida, da fonte que a Rá-Di-Andê bebe e comecei a pensar sobre comunicação indígena aos seis anos de idade, que foi no programa de índio, que você tem uma participação imensa na existência não só do produto, mas do formato, na produção, na dinâmica, trazer o pessoal, falar. Claro que tem os apresentadores, os hosters do programa, mas você sempre esteve atrás desses bastidores em alguns momentos à frente, faz a salvaguarda até os dias atuais. Conta uma história um pouquinho da gente, como é que nasce o programa de índio no seu olhar, na sua vivência, no seu dia a dia, fora daquelas questões que a gente já conhece, que é que conta, muita gente conta, mas e aí, como foi, Ângela, essa experiência de construir uma comunicação indígena dentro de uma universidade, num programa de rádio, num formato, numa época que a história realmente tem muito a contar? Conta um pouquinho pra gente. Boa tarde para todas as pessoas que estão aqui junto e estão acompanhando. Eu sou jornalista de formação e desde os primeiros trabalhos como jornalista na grande imprensa, o meu compromisso com a questão indígena sempre estava em primeiro lugar. E desde o começo do movimento indígena, 78, 79, os primeiros encontros que eu tive, o privilégio de poder estar junto, de acompanhar, eu sempre procurei colocar meu conhecimento, minha área de formação a serviço do movimento e das necessidades que a gente vinha acompanhando nessa área de comunicação. E em 83, a gente fez uma primeira experiência, 83, 84, a UNI, União das Nações Indígenas, fez uma primeira experiência de comunicação com um jornal impresso. Era um jornalzinho dobrado, era um papel A3 dobrado em 3 e chamava Jornal Indígena, era impresso aqui em São Paulo, com artigos, com notícias, com informações. Acho que o Eliane chegou a colaborar com esse jornal, não tenho muita certeza, mas o Álvaro Tucano, o Paulo Bororo, um grupo de jovens indígenas da época que estavam nessa luta já colaboravam com matéria escrita para esse jornal. Só que, na verdade, o efeito dele era muito mais para comunicar para uma população não indígena, urbana, sobre a realidade do povo indígena do que, na verdade, chegar para as comunidades. O processo de distribuição era muito complicado. E aí veio a ideia de usar a rádio nessa comunicação. E no começo, a proposta era de fazer um programa, como o Ailton falava, o Ailton Krenak e o Álvaro foram as duas pessoas à frente desse trabalho. Ele dizia que era um programa de índio para amansar branco. Então, a proposta era atingir um público urbano, desinformado, sobre as questões indígenas, principalmente no momento que a gente estava saindo de um período de ditadura muito difícil, muito doloroso, muito violento. Então, em 1985, começa essa experiência do programa de rádio. A gente conseguiu um espaço na rádio USP, na Rádio da Universidade de São Paulo. Eu sou formada pela USP e tinha uma relação com o pessoal da rádio. Então, meu papel foi muito de fazer essa ponte e de abrir esse espaço para a voz e para o pensamento da população indígena. O Ailton e o Álvaro não eram os apresentadores, na verdade, eles conduziam todo o conteúdo do programa. Meu papel era muito mais de produção, da logística, das necessidades, horário de estúdio, porque a rádio da Universidade de São Paulo era muito precária, tinha dois estúdios para manter toda a programação no ar e numa época de muita abertura, maravilhosa, porque tinha programas da comunidade negra, tinha programas para crianças, tinha programas de mulheres, tinha programas sobre literatura e o povo indígena também conquistou seu espaço dentro dessa programação. Mas era uma briga por estúdio, por horário de estúdio, o programa tinha meia hora, mas usava muito mais tempo para gravação e toda a logística de ter as pessoas indígenas em São Paulo naquele dia que era possível gravar era realmente árduo, esse trabalho de bastidores. E depois que a gente conseguia conciliar a presença das lideranças, o horário, aí era por conta de quem estava dentro do estúdio. A gente não tinha roteiro, não tinha nenhum formato pré-estabelecido, cada programa tinha sua própria dinâmica, dependendo de quem era o entrevistado ou muitas vezes não tinha um entrevistado e o programa era conduzido só com música e informações. Acho que uma outra grande inovação também foi a reiculação da música indígena numa emissora de rádio, porque isso não existia. Então, o meu trabalho era de colocar essa arquitetura em pé para que o programa acontecesse. Depois a gente foi adquirindo um pouco mais de experiência, conseguimos um gravador portátil, porque quando começou não tinha absolutamente nada, e aí com o gravadorzinho já conquistamos mais independência, porque quando Ailton Álvaro ou Viraci Brasil ou Megaron, tantas pessoas da época viajavam, mandavam material para a gente, a gente começou a receber muita fita cassete das aldeias com material, e para nossa surpresa o programa foi muito além do que a gente imaginava, ele atingiu a população indígena de uma forma muito poderosa. Aí ele começou a ser distribuído pela rádio Caioá, do Mato Grosso do Sul, de Dourados, e a rádio Caioá não era uma rádio educativa, era uma rádio comercial, mas eles transmitiram o programa durante quatro anos. O programa foi para a Universidade de Itajubá, para a Rádio de Santa Maria, a gente teve alguns momentos em Aracaju, em alguns momentos em Rio Branco, em Niterói, mas não se sustentava. Eu acho que era um incômodo muito grande esse pensamento e essa voz indígena com tanta liberdade. O programa ficou fora do ar em dois momentos, quando teve uma mudança na reitoria da Universidade de São Paulo, no segundo ano de veiculação, o novo diretor da rádio disse que o programa era muito ruim, os apresentadores não tinham boa voz, nem um português adequado para apresentarem o programa, e que precisava ter roteiro para análise e aprovação anterior. Colocou uma série de questões, então ele queria que a gente fizesse um roteiro, que a gente apresentasse o roteiro e os apresentadores da rádio fizessem a apresentação do programa. E aí a gente disse que não, e o programa saiu do ar, os ouvintes pediram o retorno, a gente retornou, isso aconteceu de novo dois anos depois, quando mudou de novo o diretor da rádio, mas era uma batalha manter o programa no ar, sem recurso, e construindo uma experiência na marra, porque ninguém tinha esse histórico de rádio. Eu trabalhei com televisão, trabalhei na TV Bandeirante, mas rádio não. Existia algum planejamento na época, algum pensamento dos movimentos sobre pensar comunicação indígena? Não estou falando de ativar mídia, estou falando de ter uma comunicação própria, nacional, existia nos bastidores esse tipo de diálogo? Existia uma preocupação de como estar distribuindo informação de qualidade verdadeira, pela voz mesmo das pessoas indígenas, existia essa busca. Na época a gente teve conhecimento de vários rádios indígenas e outras experiências de comunicação em outros países da América Latina, a Igreja Católica tinha uma rede de rádios comunitárias, de rádios católicas mesmo, acho que era rede de rádios católicas, nos outros países, no México, na Bolívia, no Peru, no Equador, essas redes de rádios católicas eram importantes pontos de referência para a população indígena. Aqui no Brasil a gente não conseguiu, apesar de tentar muito, a gente não conseguiu acesso a essa rede, por isso a gente ficou nessa rede mais de rádios educativas, e sim, essa preocupação existia, mas era um tempo em que a própria comunicação era muito complicada, nem telefone, para se falar por telefone com outro estado ainda era muito complicado, a maioria das aldeias não tinha nem um orelhão, então eu acho que a questão da comunicação na década de 80 era completamente diferente de hoje, a grande mídia não dava espaço, então tinha os nanicos, tinha alguns jornais alternativos que abriam espaço, mas que o pessoal nessa época do movimento indígena queria era falar diretamente, sem intermediários, e o que se encontrou foi o programa de índio, e depois nós começamos a produzir programas especiais em fica-café para as aldeias, mais perto da constituinte nós fizemos uma série de programas informativos para as aldeias, e aí eram 800, 900 ficas-café copiadas, e a gente distribuía isso por uma rede maluca, que tinha de tudo, tinha as longas que trabalhavam em terra indígena, alguns funcionários de funai que ajudavam, algumas pessoas do CIMI ajudavam, alguns estudiosos, pesquisadores, mas a gente construiu uma rede incrível de distribuição, a gente chegou a distribuir 1200 ficas, e isso a cada dois meses, às vezes as ficas demoravam dois meses para chegar na aldeia, no seu destino final, e é incrível porque 30 anos depois tem gente que ainda tem essas ficas-cafés guardadas, e como o programa era atemporal, e eram só indígenas falando, ele podia ser ouvido e ouvido e ouvido por todo mundo, coletivo, isoladamente, e continuava importante e com informação de qualidade apesar do tempo. Isso é o máximo, porque até a Rádio Andê utiliza mesmo os programas de índio, os episódios as pessoas acham que são programas contemporâneos, de momentos agora, e falam que tem 30 anos, e é para falar, por mais que pareça ter a mesma de hoje, os problemas sejam de hoje, é o que antecede a esse tempo. Eliane, você que – peguei ela de surpresa –, a rede, essa rede de comunicação que você implementa, a sua história, como essa sua história sobre comunicação indígena, essa rede de mulheres, como é que nasce isso? Eu gosto muito dos bastidores, como foi chamar o pessoal para se unir, fazer esse material impresso, você trazer cartunista, trazer pessoas, como é que você conseguiu convencer esse povo todo a se unir? Porque é difícil, não é? Boa tarde a todos e todas. É um prazer estar participando do programa, todas aqui e todos. Eu conheço os trabalhos, me identifico muito com cada pessoa que está participando, cada uma tem sua especialidade, o seu valor, a sua trajetória. Então, isso é muito importante, porque quando a gente reconhece o trabalho do outro, a gente cresce. Quando a gente aprende também com o outro, a gente cresce. Em segundo lugar, eu quero avisar à direção da transmissão que o pessoal não está conseguindo ver o programa, porque entra uma música na página da Rádio Andê. Então, Janote, vocês estão vendo eu no celular? Porque algumas pessoas, somente o Tony Lothar, que está preocupado, porque disse que só tem uma música. O meu irmão também me avisou. Então, algumas pessoas estão me avisando que não estão conseguindo ver a transmissão. Estamos resolvendo, Eliane. Estou aqui resolvendo. Ah, sim. É uma coisa do programa mesmo, mas estou resolvendo e quero também tranquilizá-la. Ainda não está no ar. É, quero também tranquilizá-la, porque está sendo toda a conversa gravada, então também disponibilizada na rádio e tudo, mas vamos conseguir colocar no ar. Tá bom. É uma pena, porque justamente na minha fala e da Angela Papiânia, a gente não está sendo transmitido ao vivo. Mesmo que a gente não transmitir ao vivo, a gente vai transmitir porque está sendo gravada. Então, vai ficar num loop eterno, com certeza, porque faço questão que essa memória, tudo isso que a gente está conversando, os nossos ouvintes, espectadores, alienígenas, pessoas que tiverem menos a partir de agora, alguém vai receber essas informações e não assistir. Não se preocupa com isso. Pode não ir ao vivo, mas com certeza chega até os nossos ouvintes. Olha, eu desde criança, desde criança que eu funciono como um pombo correio. Desde criancinha, já desde seis, sete anos, quando me alfabetizei, porque a minha família é imigrante, imigrante da área indígena, por ação violenta do colonizador. Então, minha família migrou para Pernambuco e depois para o Rio de Janeiro. E foi morar, literalmente, primeiro na rua, depois no Morro da Providência. E eu nasci nesse contexto, depois da Segunda Guerra Mundial. Eu já sou bem velhinha, já estou aqui com meus 72 aninhos, mas estou aqui firme, firme. Passo mal um pouquinho, passo mal um pouquinho ali, mas continuo. Então, eu sempre fui um pombo correio da minha família entre a comunidade potiguara, porque como minha família sofreu esse processo de violência, precisava se comunicar com a comunidade e ninguém sabia escrever, todo mundo só assinava com o dedo. E eu me alfabetizei e minha avó, recebia, minha avó, minhas tias-avós, recebiam cartas locais e tinham que responder. E eu fui alfabetizada dentro de casa, por pessoas de fora. E aí eu comecei a ser a intermediária de comunicação. Bem, isso aí foi um momento. Segundo momento, eu estudei, fiz faculdade, faculdade. E quando eu terminei a faculdade, já em 1978, 1977 para 1978, eu comecei a visitar o meu povo, a retomar, fazer viagens de volta da minha família, por indicação mesmo delas, para que a gente buscasse essa história de por que meu bisavô tinha sido assassinado lá e tinha desaparecido, e por que a família teve que fugir. Eu conto sempre essa história, essa história está em todo lugar, está até na Wikipédia. Mesmo assim, esse ainda é um lado que a gente vê nos nossos povos. Os povos veem ainda essa situação de perseguição política, da não constituição dos direitos humanos. Mas assim, querendo voltar para o assunto, eu comecei a fazer o que a minha avó pedia. Então, eu visitei a comunidade, minha filha foi batizada lá, Tagira, você sabe disso, você já me ouviu falar. E foi assim que a gente começou. E nas articulações ali do dia a dia, não teve nada assim, ah, vou fazer tal trabalho, eu me formei em tal coisa, você tal coisa. Não, não foi assim, não. Nasceu-se espontaneamente, nasceu de um grupo de mulheres que tinham problemas sérios porque havia muita violência doméstica, havia uma situação do alcoolismo muito grande, havia arrendamentos de terra, havia várias coisas irregulares na comunidade que eram realizadas por gente que vinha implantar novas ideias, novas ideologias, novos hábitos, novos costumes e nova forma de ganhar dinheiro. E uma forma de ganhar dinheiro ilícita. Por isso que eu fui a primeira pessoa a denunciar nas Nações Unidas a questão da violação, da invasão das terras indígenas, que na época a fábrica de tecidos, já em 1910, a fábrica de tecidos, que era da família Ludwig, já estava colonizando o povo ali. O povo já estava sendo massacrado. E depois, mais modernamente, as fábricas de tecido de Rio Tinto. E depois disso ainda tinha o arrendamento de terras por conta da cana de açúcar. Você sabe dessa história também. Então, eu via que havia um grupo que se beneficiava, indígena, e outro grupo que vivia ao pérrimo, porque não se era compartilho aquilo democraticamente. Havia um desequilíbrio. Então, a mulherada, alguns homens também começaram a reclamar. Então, a gente começou a pensar o que fazer. E foi quando o cacique Potiguara, João Batista Faustino, que hoje, se estivesse vivo, já estava com quase 100 anos, ele pediu para que a gente fizesse um encontro. E foi quando a gente realizou o primeiro encontro Potiguara de luta e resistência. Se tiver algum Potiguara ouvindo, está vendo que isso aconteceu realmente. A gente fez cartaz, a gente divulgou no Brasil inteiro. Nesse evento, eu senti necessidade de escrever uma cartilha de conscientização política, porque estava havendo uma relação de domínio do poder, o opressor e o oprimido, mesmo dentro das comunidades. E isso acontece ainda hoje. Isso é uma prática capitalista, imperialista, mesmo em pequena escala, o poder do maior sobre o menor. Então, nós realizamos a tarefa, esse encontro pedido do cacique, e realmente houve uma... Olha, foi um tumulto, uma confusão, porque os arrendatários que eram indígenas também começaram a ficar super revoltados. Eu sofri uma perseguição política, eu tive arma na cabeça, eu tive uma perseguição horrível, eu fui levada pela Polícia Federal, porque as pessoas ali que estavam sendo beneficiadas me denunciaram que eu não era... Aí começaram com essa ideia de que você não é indígena, que é esse papo que vocês todos devem ter passado nas comunidades de vocês, que é a primeira estratégia que o indígena colonizado usa, essa primeira estratégia de dizer que você não é índio. Isso é uma coisa absurda, que hoje a gente já detecta que é a primeira estratégia até do governo, até do FUNAI, até das entidades que trabalham na questão antropológica, usam, utilizam isso. E graças a esse grande movimento nesses últimos 40 anos que nós conseguimos trazer essa ideia do indígena, de trazer o indígena urbano, o indígena não-aldeado, para essa questão do indígena de contexto urbano, que muitos de nós fazemos parte, porque nossos pais, nossos avós, nossos bisavós foram perseguidos, não tivemos oportunidade de estudar dentro da comunidade, precisávamos de políticas públicas, então a comunidade tinha que sair da aldeia da comunidade para estudar ou por qualquer outra razão, pois essas pessoas continuavam sendo estigmatizadas. Tentam até hoje, mas existe um movimento forte, graças a Deus, e a etnomídia, o jornal, a revista, os materiais didáticos, a literatura indígena, por exemplo, os livros que são publicados, isso tudo está fazendo uma grande esfera de força e de luz, de conscientização para a sociedade, para que a própria sociedade tenha empatia com a questão indígena. Por isso que a gente hoje conseguiu eleger esse mandato do CUCAR, conseguiu porque a gente vem pressionando com a etnomídia nesses anos todos, cada um de vocês aí trabalhando nas suas áreas, nas articulações, a gente trazendo a informação. E com a internet foi o sucesso. Eu considero a questão indígena na parte da etnomídia um grande avanço nas últimas décadas. Então, resumindo, para que possa dar oportunidade a outras pessoas para falarem, nós começamos com o jornal também, o primeiro jornal da mulher indígena está aqui, não sei se vocês conhecem, mas é um jornal de oito páginas que também fez muito sucesso. A cartilha de alfabetização, já mostrei muito para as pessoas. E a cartilha fundamental, parece que só tem a capa agora, foi a terra e a mãe do índio. A capa está aqui, o livro está aqui, a parte do livro está aqui, a gente queria reeditar, mas não foi possível. Então, eu começava assim, com o pessoal se organizando em círculos para debater a sua questão. Então, isso aqui faz parte... Espera aí, deixa eu emendar aqui para vocês verem. Isso aqui faz parte... Essa aqui é a primeira mensagem que nós lançamos da organização indígena, dos círculos de conversa, das rodas de conversa, para que a gente... Então, esse material aqui foi distribuído na área portuguara e depois, um tempo depois, a cartilha de alfabetização, proposta pela Unesco, também em círculo. O círculo da ancestralidade, a gente traz essa questão da ancestralidade de forma bastante forte. A cura da terra, que é o lançamento também de um material que traz a questão da ancestralidade. Eu sempre tenho trabalhado com a questão da ancestralidade, porque é uma forma de você mostrar para a sociedade, que é um ponto que identifica as outras etnias, que é a questão da ancestralidade que nós, indígenas, temos, e que o branco, as outras sociedades, as outras etnias, os japoneses, os chineses, também trazem essa questão da ancestralidade. Então, quando a gente aborda a ancestralidade e mostra que a identidade indígena existe através dessa identidade, a gente pode provar que nós somos povos diferenciados, com línguas diferenciadas, com lutas, com cultura, com uma territorialidade específica, e mais, que a questão da sobrevivência indígena depende da questão do meio ambiente, da preservação do meio ambiente, tanto é que, em 1992, povos indígenas foram convidados para a Conferência Internacional de Meio Ambiente. Estavam aí o Paekhan, Marco Derena, o Idyaruri, o Ayoto Krenak, o Megaron, o Raoni, e eu também que apresentei lá o primeiro jornal da mulher indígena, mas eu estava lá escondidinha, não aparecia, e não faz mal, mas estava, eu estava lá, e digo a vocês que eu estava lá. E foi assim, foi dessa forma, gritando, falando, espermeando, fazendo evento, encontro, assim como todos fazem aqui, cada um promove o seu evento, não desiste, não desiste, são as mesmas pessoas que eu vejo desde o começo, tem um grupo de pessoas brasileiras, indígenas ou não, que estão ali, pode passar anos, pode chover, pode cair, chover canivete, mas são as mesmas pessoas que estão ali mostrando que existe uma verdade, que nós somos as primeiras nações do planeta, do Brasil, e que precisa ser reconhecido em todos os sentidos. Então eu deixo aqui a minha mensagem, meu coração, meu carinho, desculpa a minha forma de falar, que eu sou assim mesmo, e vamos seguindo, a luta que segue, e que os jovens ouçam as nossas faísquinhas que a gente vai jogando por aí, através dos livros, através das rádios, da literatura, da pintura, da pintura corporal, da pintura no seu contexto maior. E estou muito feliz de estar participando dessa mostra no Rio de Janeiro, eu sou a pessoa que estou narrando, acabei de fazer a narração na semana passada, estou muito feliz na plata. E vamos continuar, porque a luta continua, não parou não. O pessoal do COCAR está lá, mas a gente tem que continuar aqui na mídia. Com certeza, muito obrigado. Gente, só para lembrar, o ano que vem nós teremos um encontro de comunicadores indígenas que vai acontecer aqui no Rio de Janeiro, esse encontro nacional vai ser em novembro do ano que vem. O último dia vai ser no aniversário da Rádio Andê, que será de 10 anos. Antes de mal, já vou dizer o seguinte, o primeiro dia é dia de festa e o último dia é dia de festa. A gente vai ter três dias para fazer coisa muito séria e dois dias para fazer farra mesmo, beber, comer, contar histórias, se divertir, encontrar outras pessoas. E no último dia, no caso, o aniversário da Rádio Andê, de 10 anos, é bom comemorar, é bom estar junto com a gente, vai ser na Associação Brasileira de Imprensa, na ADI. O local exato da festa a gente ainda não sabe, até pela quantidade de pessoas indígenas que queremos trazer de todas as regiões do país. E tem indígenas que vão vir de outros países, que já se colocaram à disposição, tem gente já comprando até passagens. Então, a gente não saiba que o encontro da etnomídia, da comunicação étnica, da origem, de formação, vai acontecer aqui no Rio de Janeiro o ano que vem. Antecipadamente, já está todo mundo convidado. Então, a esse convidado, a gente pretende dar uma infraestrutura para vocês poderem estar conosco, para a gente fazer muito bate-papo, sem muito processo acadêmico. É muito mais contar experiências, trocar, e trazer uma juventude indígena e conhecer. Outro ponto específico é que, nesse mesmo local, será fixada a sede da Rádio Andê. Então, a Rádio Andê vai ter um espaço dentro da Associação Brasileira de Imprensa, um andar para montar os estúdios, a agência de notícias e uma área de formação de comunicação étnica. Então, antecipadamente, já convido vocês. Agora, a gente entra no bate-papo com uma pessoa que até gagueja, porque eu sou fã mesmo, sou fã das filhas, sou fã do trabalho. Depois de fazer uma busca profunda, dentro de vários acervos sobre comunicação indígena, étnica ou presença de indígenas em outras comunicações, encontrei a Andila. A Andila eu conheço, eu a vejo no meu mundo, também vejo nos meus seis anos de idade. A minha história começa acompanhando meu pai, o Dário, de quatro para cinco anos, aos seis anos, em São Paulo. Já circulava e observava. E fazendo essas buscas, encontrei coisas de Andila. Andila educadora, Andila mãe, Andila falando sobre os problemas do território em trabalhos com o pessoal do Cine e outros produtos que foram somando. E Andila, seja bem-vinda. Conta um pouco da história, como essa comunicação chegou na tua vida educacional e como você processou isso com as suas filhas. As suas filhas fazem parte desse processo todo, apesar de cada uma seguir carreiras lineares, medicina, direito, comunicação. Como é? Conta um pouquinho para a gente. Porque eu sou fã, então eu fico meio nervoso com você. O microfone está fechado. Então, Ana Puaca, eu fico feliz de poder estar aqui, na Ana Puaca, nessa roda de conversas, e lembrando que nós estamos dentro da década das línguas indígenas, lembrando que o kangang é uma das línguas que está em risco de desaparecer. Eu quero te agradecer, Ana Puaca, pelo convite. Eu estava até falando para o colega ali que eu não estou aceitando nada, Ana Puaca. Live, palestra, não estou fazendo mais nada, só estou escrevendo. Aceitei o fato de estar aqui com vocês, porque eu achei que seria bem importante, e também porque eu te conheço e sei da importância da comunicação no nosso meio para os povos indígenas. Eu quero me apresentar para o pessoal, para as parentes que a gente conhece, que eu só conheço Eliane, e na pessoa da Eliane eu quero cumprimentar todas as parentes que estão fazendo parte dessa roda de conversas. Um abraço bem kangang mesmo para vocês. E eu quero também contar um pouco da minha experiência de vida, da minha trajetória. Dizer quem eu sou. Eu sou kangang. Meu nome é Andila. Em kangang, meu nome é Nibukishain. O meu povo kangang mora na região sul do país, sul de São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Eu sou do Rio Grande do Sul. Eu sou presidente da instituição Inka, Instituto Kangang, e sou coordenadora do Plano de Cultura. O Kangang é o terceiro maior povo indígena do país que mora na região sul. E vivemos num território, nossos territórios são mínimos. É um povo grande em territórios pequenos. Então, é um problema sério para nós a questão da diminuição das nossas terras, que aconteceu na década de 60, 70, que o governo do estado mesmo fez a reforma agrária das nossas terras. Elas foram diminuídas. Mas assim, Ana Plata, eu quero contar um pouquinho da minha trajetória enquanto comunicadora. O que você nos convidou para que a gente pudesse falar? De que maneira a gente tem encaminhado essas coisas desde então? Na década de 70, no começo da década, eu estava fazendo a minha formação como professora bilíngue. Nos formamos dois anos depois e começando a trabalhar, eu estava na terra indígena Guarita, uma das maiores terras do Rio Grande do Sul, mas ela estava totalmente arrendada. E as famílias indígenas já não tinham mais espaço para plantar nada, nem uma mandioca no seu quintal, porque as terras eram todas arrendadas. E daí o povo caingangue começou a se revoltar e questionar a terra. Então a gente conseguiu mobilizar cine, pessoas que trabalhavam pró-índios, para que nos ajudassem a pressionar o governo para que retirassem de dentro das nossas terras esses arrendatários que a própria Sunai, a CPI, tinha colocado para dentro dos nossos reservas. E isso, infelizmente, não aconteceu. Então, em 1975, culminou que a Sunai não respondia mais pelos arrendamentos. Acabou o arrendamento, mas os arrendatários ficaram dentro das nossas reservas. Ficaram lá plantando, não pagavam mais, mas ficaram lá dentro. Ficou uma situação pior ainda. E a Sunai não se sentia responsável por retirar esse pessoal de cima das nossas terras. Então, foi na época que, em 1975, eu escrevo, na época do governo militar, eu escrevo uma carta para o presidente da República, assim como um pedido de socorro. Porque eu vi que naquela época, em 1975, não tinha a Constituição Federal que garantia nada para nós. Nem as nossas terras eram garantidas. Então, foi realmente um grito de socorro aquela carta. E eu pensava comigo assim, ninguém está fazendo nada. A Sunai que deveria estar fazendo o quê? Que era a entidade que foi criada para cuidar dos nossos interesses, dos nossos direitos. Não aconteceram, não faziam nada. Então, eu fiz essa carta para o presidente da República, Inglésio Gádio, na época, o general, tentando sensibilizar ele da nossa questão. Ele nunca me respondeu essa carta. Ele nunca me respondeu. Aí, quando eu percebi que ele não ia responder, eu mandei publicar essa carta. E essa carta teve tanta repercussão que eu paguei muito caro, sabe, Ana Poeta, pela repercussão que essa carta teve. Tanto dos arrendatários como políticos, que eram a favor dos arrendatários e essa coisa toda. Nós índios estávamos lá, abandonados. Ninguém fazia nada e, nessa época, eu já estava trabalhando na Sunai. Porque, assim que a gente terminou a nossa formação, nós fomos contratados como professores bilingues. Na verdade, nós nem éramos chamados professores, nós éramos chamados monitores bilingues. Então, eu já era servidora da Sunai. E daí, o que aconteceu? Quando essa carta estourou na mídia, o Zero Hora, Correio do Público, Folha de São Paulo, todo o Brasil ficou sabendo. E daí, a Sunai, na época, o único meio de comunicação que as áreas indígenas, as aldeias tinham para fora, eram os rádios amadores da Sunai dentro das áreas. Era o único meio de comunicação que tinha com a administração regional, que na época era em Curitiba. Aí, o que aconteceu? O administrador, o delegado, como era chamado, mandou um radiograma para mim. E daí, o chefe do posto, onde eu estava, em Guarita, ele me chamou no escritório e me disse – olha, você assina o recebimento desse radiograma que o delegado está te mandando. Daí, eu fui olhar e ele dizia assim, que era para mim parar de fazer denúncia, porque senão a Sunai ia me botar para a rua. Eles iam acabar me demitindo. Então, ele estava me avisando que não era mais para mim dar nenhuma entrevista, não era para fazer mais nenhum tipo de denúncia. Daí, eu fiquei pensando, e agora o que eu faço? Eles estão com a polícia atrás de mim e eu escondida. Eu me escondia, porque eles me procuravam e eu estava trabalhando. Era numa missão religiosa que tinha em Guarita. Daí, o pastor que coordenava aquele local me falou assim – olha, você não pode ficar se escondendo o tempo todo, porque esse pessoal não para de procurar. Daí, eu falei para ele assim, mas a Sunai me mandou um radiograma dizendo que se eu der mais uma entrevista ou continuar fazendo denúncia, eles vão me demitir. Então, eu vou marcar uma coletiva para a imprensa. Daí, ele disse, você que sabe. Daí, eu marquei a coletiva para a imprensa. Daí, eu peguei o radiograma, porque eles dão uma via para a gente, e daí eu mostrei aquele radiograma. Ele disse, eu estou sendo ameaçada de demissão. Eu quero dizer publicamente aqui para a Sunai que eu não nasci servidora, eu nasci caindo em gangue e até aqui eu não morri de fome. E não é daqui para frente que vão morrer esses que me demitiram. Mas eu vou continuar defendendo o meu povo, os nossos direitos. Eu vou continuar defendendo. Então, vocês se sintam à vontade para me demitir. E aí, os jornais exploraram, dizendo que eu estava sendo ameaçada e aquela coisa toda. E daí, o pessoal me oferecendo emprego. O Simi, é o Simi na época, do Rio de Janeiro, até esse cara era o presidente do Simi na época, depois ele foi mais tarde, ele foi presidente da Sunai também. Como é que era? Júlio Geiger, eu acho. Ele mandou uma carta para mim, um telegrama, dizendo assim, Dila, você continua com a sua luta, viu? Pode continuar, porque se a Sunai te demitir, nós vamos te pagar o mesmo salário teu, por isso, continue lá fazendo o seu trabalho. Aí, a solidariedade, sabe? E eu fiquei esperando a Sunai me demitir. E aí, os dias foram passando, os dias foram passando, e eu fiquei aguardando ver o que a Sunai ia fazer. Eles demitiram a pressão externa, foi tão grande. Olha só o que a mídia faz, né? Naquela época, né, Ana? Foi tão forte a pressão para cima da Sunai que eles demitiram o delegado da Sunai que me mandou o rádio gringo. Então, para dizer a nossa verdade, eles me demitiram. Então, eu consegui me aposentar dentro da Sunai, naquela época. Que legal! E assim, muito a gente... Tem que ser, se você não for para cima deles, assim, com força, com coragem, o pessoal te cala mesmo, né, Eliane? O pessoal sempre fez isso com a gente, né? Sempre fez o nosso povo calar, né? Eu não dei braço ao CEPA aí. Só que, graças a Deus, porém, minha filha, como a Ana Paula já está falando, elas se formaram vendo o meu trabalho. Aliás, as primeiras não escolheram a formação dela. As duas advogadas que eu tenho, que é a Suzana e a Fernanda, né, eu escolhi a profissão dela. A da Lucila também, a médica, né? Então, eu tenho duas advogadas, uma médica, uma jornalista e outra escritora, né? As duas advogadas, eu achei que tinha que ter advogado na família. Eu já queria fazer, mas eu pensava comigo. Eu sou educadora, Eliane. A minha área é educação. E é uma ferramenta que eu gostaria de dizer que, assim, a gente não pode deixar de lado, é através dela que a gente pode... É a nossa resistência também, sabe? A gente... Apesar de que nós somos povos de tradução oral, a escrita, ela é muito importante. Quando eu fico analisando, na década de 70, escreveram a nossa língua não para que ela fosse preservada, para que ela não fosse esquecida, é para que a gente pudesse garantir ela, sabe? Não foi para isso que ela foi pensada. Ela foi pensada para nos integrar, para acabar com a gente. Mas eu fico analisando que o tiro saiu pela culata. De certa forma, se o Cain Gander naquela época não tivesse sido escrito, nós já não falaríamos mais a língua. Porque eu fui proibida de falar a minha língua dentro da minha escola, dentro da minha aldeia. As repartições públicas não permitiam que se falassem em Cain Gander em nenhum lugar. Há pouco tempo, Eliane, não faz uns dois, três anos. Eu conversando com alguém do setor de educação, com o meu cacique que estava junto comigo, fazia uns quatro, cinco anos isso, e eu falava... Ele me fez uma pergunta, e eu respondi para ele em Cain Gander, porque ela estava falando em português e ele me falou em Cain Gander alguma coisa sobre o que ela tinha falado. Aí eu expliquei para ele em Cain Gander, e ela falou assim, é proibido falar Cain Gander, é proibido falar outra língua. E daí minha filha, que é advogada, estava junto. Eu não lembro se era a Susana, acho que era a Susana, e ela falou assim, não, são direitos que eles têm de falar a língua. Em qualquer lugar. É legal isso. Eles têm um paro legal para fazer. Quer dizer, Eliane, então, as minhas filhas se formaram dentro do meu sofrimento, sabe? Porque a nossa luta é árdua, Eliane. Sabe, ainda mais eu que vivi dentro de uma reserva, dentro de uma aldeia, até agora pouco, há pouco que eu saí. É por causa desse problema que você está falando, de perseguições, coisas de dentro, que essa civilização, essa cultura que se visibilizava, levaram tantas coisas ruins para dentro das nossas aldeias, que hoje as próprias lideranças nossas são piores do que aqueles que nos perseguiram. Por exemplo, na década de 70, quando eu fiz essa carta, eu fui ameaçada de morte por políticos, prefeitos, que daquela região. Eu tive que ir embora. Eu fiquei quase dez anos lá no Pará, Bíblia, Maranhão, até que eles esquecessem de mim. Quando eu voltei, eu assumi o setor de educação, que era em Quarto Fundo na época, estive em uma das nossas escolas, em Tenedente Portela, que são várias escolas. Era uma escolinha que era municipal e eu fui conversar com o prefeito que estava tendo problemas. Eu chego lá, acho que uns 15 anos depois, eu fui entrando na sala do prefeito. Não era o prefeito, um deles que me ameaçava de morte, sentado me olhando. Eu entrei aqui e fiz de conta que eu não conhecia ele. Eu cumprimentei ele, conversamos sobre o problema, ele me ajudou, resolvemos o problema. A gente enfrenta cada tipo de coisa. Mas a vida continua, a gente tem que tocar o passo para frente, porque a luta continua. Então, eu quero agradecer por poder participar dessa roda de conversa. Mas, Ana Plata, se a gente sentasse no final de semana, a gente teria tantas coisas para se falar. Está tudo explodido, que ninguém sabe o que aconteceu. Muito loucura. Mas estou com o meu livro pronto, meus sapatos, e vou publicar ele. Agora, dessa, eu consigo publicar. Mas, Ana Plata, eu fico pensando que, naquela época, se era essa a comunicação que nós tínhamos, hoje, vocês, os desafios estão aí. Mas hoje nós temos jornalistas, nós temos comunicadores, como você, por exemplo, Ana Plata. Temos a Dayara, temos a Sonia, a Soninha, a Inganga, que é a minha Soninha, que a minha luta na comunicação, eu já passei para ela, por isso que eu não estou aceitando mais nada. Eu acho que é hora delas começarem a subir e tocar o passo para frente. Não é fácil. Eu sei que não é fácil essa luta que eu estou passando para elas. Mas é isso aí. Os nossos filhos percebem a nossa luta, eles crescem vendo essa luta e acabam também se preparando melhor do que nós fomos preparados para enfrentar essa situação de maneira diferente, muito mais bem preparados, porque a comunicação que nós temos hoje é totalmente diferente daquela época. Hoje nós temos uma legislação que é pertinente, uma legislação que contempla as nossas diferenças, os nossos direitos, eles têm amparo legal para a luta. Na época, nós não tínhamos nada disso ali. Nós não tínhamos nada disso, mas a gente estava ali na luta. Nós não deixamos a peteca cair, então não é agora que o pessoal vai esvaziar. Então, eu desejo boa sorte para vocês, Ana Tuaco, para todos os nossos comunicadores, porque a luta está aí, na nossa frente, e ela precisa ser enfrentada, Ana Tuaco. Nós que agradecemos mesmo, muito, muito mesmo, a sua disponibilidade, o seu tempo. Eu sei que você realmente já não estava fazendo essas participações, mas fiz questão de pedir a Fernanda, até porque no registro histórico, novamente, eu sempre insisto em dizer o que sou na comunicação. Eu faço jornalismo hoje, sou radialista, mas me vejo muito mais como um comunicador. Eu prefiro o termo comunicador do que a parte profissional, até porque me deixa flexível, me deixa muito mais à vontade e só uso as carteiradas, só os CRT e os DRT da vida para questões muito mais sindicais ou dentro desses espaços. Mas, fora disso, é comunicador mesmo, me permito e agradeço, sim. Eu não sei como, mas vou ter que usar algum mecanismo de estar junto de vocês em algum ponto desse país, fora o encontro nacional que vai ter, para a gente botar esses causos em dias mesmo. Tomar um chimarrão gostoso. Eu gosto muito de chimarrão. O chima é uma coisa muito importante para mim. Agora há pouco eu tirei a cuia daqui. Uma cuia foi até a Vangri que me deu. Tem uma cuia que foi a Vangri que me deu, que está aqui. Então, tenho meu material e tem minha erva-mato, que eu sempre recebo de várias regiões, tanto do Mato Grosso do Sul quanto do Sul mesmo. Eu agradeço de você estar. E nesse bate-papo, a gente vai de sul a norte. Na casa de Laís, seja bem-vinda. Novamente, também sou fã pelo trabalho que você faz. Não só na Amazônia, na Amazônia Real eu vejo como um ponto de um tempo que é similar à Rádio Yandê de 2013, se não me engano. Foi alguns meses, um mês antes da Yandê, a Amazônia nasce, em outubro, se não me engano. A Rádio Yandê é em novembro, então um mês antes estava despontando, apesar de não ser uma étnope de indígenas. Você defende isso muito bem e entendo. Mas você está em uma região onde o étnope não tem para onde correr. Está ali esse arcado. A Amazônia Legal, onde você está constantemente com vários parceiros, vários indígenas e não indígenas, está ali te cercando. Como é que nasce essa comunicadora, essa jornalista, Laís? Porque lembro que estava um dia em São Gabriel da Cachoeira, num bate-papo com o Paulo De Sano, e a gente estava num bar e a gente estava falando sobre a Amazônia, sobre você, as suas relações, ele passando os trabalhos investigativos que são feitos tanto pela redação, o bom trabalho que vocês fazem de entrega sobre o meio ambiente, direitos, mas como isso vem em você, a persona antes da instituição de mídia. Conta um pouquinho da sua história para a gente. Muito obrigada, Ana Pocah. Fico muito emocionada de estar aqui. Depois de ouvir as palavras da Eliane, tenho vontade de chorar, menina. Porque também percebo o quanto a mulher indígena é apagada. Por exemplo, a Eliane reforçou no final que era estar lá. Mas quem que ouve falar da Eliane? Sempre são as grandes lideranças indígenas, que a gente não pode de jeito nenhum contestar a relevância, mas onde é que estão as mulheres? As mulheres indígenas, as mulheres negras, as mulheres quilombolas, e aqui no foco são as mulheres indígenas. Eu, por exemplo, não conhecia a história da Andila. Por que que a Andila... A Andila agora começa a falar, está aparecendo nos slides. Eu acho isso extremamente relevante. Inclusive, como é importante para as novas gerações conhecerem. Por exemplo, eu conheço a Eliane de mais de 20 anos. Acho que a Eliane nem sabe que existia. Eu lembro quando comecei a ler sobre comunicação indígena, o primeiro aporte foi o texto da Eliane. Eu trouxe para ela. Eu estava olhando e ela disse que não tem indígena escrevendo sobre jornalismo, sobre comunicação. Só tem o branco, o não indígena, escrevendo. Os agentes de tutela reinventados, que eu chamo de tutelo, agentes de tutela que querem mediar centros públicos indígenas. Então, eu acho que isso é tão relevante. Eu fiz um roteiro que já estou desconstruindo tudo. Eu ia falar uma coisa, só que eu tenho outra coisa a partir das falas de vocês. Então, estou mais cumprindo meus químicos. Então, eu acho tão importante esse momento, porque eu até aplauso e loubo a placa, por fazer só mulheres para cá. Porque eu acho isso tão interessante. Porque, geralmente, sempre tem um homem, a maioria homem, colocando uma mulher ali para dizer que tem uma mulher. É tipo quando alguém convida, chama uma equipe de jornalistas e coloca um indígena lá para dizer que tem indígena. Também na moda, isso. Agora, coloca nas caixinhas de diversidade, coloca um indígena lá para dizer que tem indígena. Então, eu acho isso tão importante. Eu acho até que eu incentivo a Andi, Loubo e outras pessoas que fazem pesquisas sobre comunicação a contar a história de vocês, ou vocês mesmos, contar a biografia de vocês. Eu não estou nem falando de mim, estou falando de vocês mesmos. Enquanto isso, eu trago muito para os trabalhos da Amazônia Real, que depois eu já falo um pouco sobre esse assunto. Só vou me apresentando. Eu sou Elaísa Farias, para quem me conhece. Eu sou daqui da Amazônia, estou em Manaus, em calor infernal. Aqui está um abraço de quente e muita fumaça, das queimadas. Tudo isso que se fala é pior do que se fala, na verdade, do sul do Amazonas que vem para cá. Parece que está sol, parece que está no bairro, mas acho que tem fumaça. Infelizmente, no rio Sul-Oeste não tem tanta repercussão. Eu sou jornalista, já vou dizer para o parlamentar, tenho quase 30 anos de jornalismo. Mas tive uma primeira etapa como repórter, quando era uma jovem jornalista, muito jovenzinha na redação, sou uma comunicadora e também sou uma jornalista, jornalista de formação. Sempre trabalhei em redação de jornal, sempre fui uma repórter. Um belo dia, fiz uma reviravolta na minha vida em termos de abordagem, o que eu queria escrever nas minhas reportagens. Já estava trabalhando em redação, não sentia muita interrupção, achava que queria falar sobre outras coisas. Sempre fui uma repórter de drama, de ir para os buracos, ir para as quebradas. Sempre fui aquela repórter urbana. Quando comecei a me interessar por esse assunto de jornalismo indígena, entrei no que comentei antes, a minha fonte foi os textos, aqueles jornais até mesmo artesanais da Eliane, que eu lia tudo. Porque lembro que estava fazendo uma disciplina, uma universidade com uma universidade, numa matéria lá na USP, que foi uma bela passagem que tive lá em São Paulo. Depois descansei, fui para Manaus. E disse que não tinha texto sobre jornalismo, que não tinha jornalista indígena escrevendo, não tinha um encontro. Além de Eliane, era Eliane mesmo. Eu não consegui encontrar porque se tinha, e deveriam ser mulheres, estava apagado. Não se sabe. Até hoje é assim. Infelizmente, até hoje é assim. E por quê? Porque há o machismo em todos os locais, incluído no movimento indígena, incluído nas terras indígenas. Isso é muito machismo. E aqui eu vou depois me reforçar como é que a gente trabalha na Amazônia Real. Mas só para falar um pouco da trajetória, eu sou uma jornalista de redação. Eu nunca escrevi sobre um determinado povo, minha comunidade. Foi no jornalismo que eu encontrei, inclusive, falando sobre povos indígenas, a minha identidade e a minha subjetividade como pessoa, como identidade é de função social, meu lugar no mundo. E foi através dessa identificação que eu incorporei também, essa neta identificação, por quê? Porque a minha família de origem indígena é do povo Satere-Mawé. Eu sou de Parintins, sou do Baixo Amazonas, da região do Baixo Amazonas. E uma parte da minha família é do povo Satere-Mawé e outra parte, que aí entra o problema do apagamento, da automarginalização, da área do Tapajós, que é possivelmente com o Durucum, mas eu não tenho certeza, eu só tenho mais certeza do Satere-Mawé. Então, mas todo aquele processo de colonização que a Eliane muito bem retratou na primeira fala dela, de expulsão e tudo mais. Então foi ali que eu me reencontrei e também que eu me autodidentifiquei, me identifico até hoje. E foi assim, a partir desse meu trabalho como jornalista, nessa minha luta, às vezes, solitária, lá em uma geração, que eu incorporei o ponto de vista dos entrevistados, dos personagens, eu não gosto muito de dizer personagens, mas é um termo do jornalismo, do indivíduo, do sujeito indígena e como é que ele se representa assim. E isso foi ao longo dos últimos, um pouco mais de 18 anos, quando as minhas passagens em redação de jornais do Manaus, de jornais onde eu trabalhei. Porque falar sobre indígenas, sobre indígenas, já se fala há muito tempo nas redações, já se falava desde quando existe, em redação, nos planos do indígena. Mas como é que se fala, como é que se falava e como é que se fala até hoje? Já melhorou muito nos últimos anos. Mas até então se falava, eu, por exemplo, aqui no meu lugar, em Manaus, eu fazia jornalismo local, quando eu falava sobre um povo... Eu virei meio que a jornalista do índio, fiquei até estigmatizada nas redações. Jornalista que só quer falar de índios, jornalista que só quer falar... Aí você fala, vai lá e fala de índios. Aí o sujeito, tem que falar, tem que fazer uma festa, está acontecendo isso, eles estão procurando. E começou-se a ter esse contato também, por exemplo, quando eu estava numa redação de jornal, em 2003, 2004, quando ninguém falava sobre o povo indígena na redação, muito menos quem falava sobre os povos muito vários do Javari. Que tem todos os evidências que estão falando que começou a existir, isso vai do Javari para esse ano, essa tragédia das mortes do Don e do Bruno. Então, naquele momento, eu comecei a fazer a matéria por isso, porque os meninos, eu falo meninos, mas eu sou tudo liderança, já em todos os momentos, os meninos. Os rapazes, as lideranças, procuravam, porque eles precisavam ter um espaço, alguns jornalistas, para denunciar desgraças, calamidades, tragédias que aconteciam lá e não aparecer lugar nenhum. Porque quando se fala, e quando se falava de povos indígenas, eu sento o povo indígena em situações muito graves, mas sempre muito recentes, e é sempre de forma estigmatizada, criminalizada, ou então pitoresca, sempre que tem que usar algo exótico, porque chama a atenção, alguma coisa. Se tiver então, aquela coisa de infanticídio, pronto, aí todos os corajosos querem fazer, sempre para criminalizar. Eu lembro que eu já até tomei uma vez uma pauta sobre isso. Então, gente, não é que eu sou repórter não, porque ela vai fazer uma coisa horrorosa para que eu faça matéria desse assunto de infanticídio. Isso não é matéria festiva. Então, eu brincava para essas pautas, porque eu sabia que, infelizmente, sem querer me gabar, eu tinha feito essa matéria, porque ninguém mais poderia fazer, não dessa forma necessária e precisa. E aí foi quando eu também me encontrei nessas pautas. Não sou indígena, mas eu também ampliei. Eu falo sobre questões climáticas, meio ambiente. Eu falo que tem gente até que confunde a Amazônia Real com jornalismo ambiental, mas a gente não fala no meio ambiental. A gente fala em jornalismo e sobre assuntos da Amazônia, de povos, grupos sociais, identidades coletivas, sujeitos, históricos, que não aparecem em nada nenhum em redação de jornal, ainda mais em uma região como a nossa, onde a imprensa corporativa é totalmente recém do poder econômico. Quem vai fazer uma matéria sobre os indígenas caripuna numa imprensa de Rondônia, por exemplo? Ninguém, porque tem imprensa toda dominada por políticos e empresários que não têm grande interesse em abrir um negócio. Então, a partir daquele momento, quando eu estava nas redações de jornal, quando eu pulei de uma redação para outra, e finalmente, já estou resumindo, porque, como falou bem a Andila, nossa história é muito longa. A história dela deve ser muito mais vistosa e interpretativa que a minha, mas a minha é um pouquinho longa também. Então, quando em 2013, eu e a Cátia, Brasil, nós cada um estávamos em uma outra redação de jornal, trabalhando como empregadas, como repórteres, jornalistas. E o engraçado foi que eu fui demitida do jornal, no jornal em que eu trabalhei, foi no mesmo mês que eu tinha passado, eu tinha ido, passei mais de uma semana lá no bairro de Jabari, que eu já tinha ido pela segunda vez, quando eu fui lá para o Maiuruna, que eles estavam vivendo uma situação terrível de ameaça de estação de petróleo. E era quase lá na fronteira com o planeta. E um dia depois, fiz um grande maltratamento de um outro assunto ambiental e fui demitida. Levei uma demissão junto com uma turma que foi demitida aqui na redação onde eu trabalhei. E eu fiquei meio assim, ah, não vou assistir a alguns frilas, como alguns jornais aqui, eu nunca quis trabalhar como assessora, embora esse também, por vezes, seja o caminho que tem aqui na região, assessora de alguma empresa, de algum político, de algum público. Aí, quando surgiu a ideia da socialidade, para integrar, são três meninas, três mulheres, uma delas é para elétrica, acabou depois saindo, ficou só ficando eu e a Kátia. A Amazônia Real surgiu dessa proposta de fazer um jornalismo. A gente é jornalista, tem essa coisa de jornalista, comunicador. Eu já estou contrado ao nosso fato. Eu acho que todos os comunicadores são jornalistas. Não tem essa coisa de ter que ter formação, faculdade, ensinamento ocidental, etnocêntrica, eurociência. É jornalista. Quando eu te falo, quando eu anoto o meu finetone, por exemplo, porque eu não gosto do étnico, eu meio que sou da escola, vocês se conhecem do PUCAC, talvez vocês sejam radicais, do João Paulo Barreto, do João Paulo de Pouco Cano, acho que você conhece, o antropólogo, o Doutor. O João Paulo odeia esses pessoal étnico, porque ele diz que é uma forma de... Ele diz que é alguém que entrou numa tentativa desesperada de encaixar o conhecimento indígena na lógica da ciência. Ou seja, mais uma caixinha. Ele é subneto. Assim que o étnico é uma coisa que dizer que é uma quase ciência, que não é ciência, mas também é mais ou menos ciência. Isso ele geralmente fala para a étnico botânica, étnico história, etc. Na étnico comunicação, no étnico mídia, eu não sei muito como se encaixa. Mas eu gosto de chamar de jornalismo. Ou então jornalismo feito por indígenas. Comunicação feita por indígenas. É isso. Não tem que rotular. Até porque existem várias formas de fazer o que se chama de étnico indígena. Hoje, então, com essa turma grande de comunicadores jovens que tem hoje, nas plataformas que estão sendo feitas, criando, se apropriando, reinventando, utilizando as ferramentas da mídia, da internet, fico muito impressionada com como cresceu o seu grupo nos últimos anos. Inclusive algumas surgiram até a partir das nossas oficinas, como a gente fez hoje. Então, não vou samba, mas vou no real. Então, a gente fundou o Amazonas Real em 2013. E desde então, são quase dez anos, né, de fazer matéria de denúncias, viajando, indo nas terras indígenas, conhecendo os lugares, aprendendo, eu falo até desaprendendo também, porque a gente achava, chega num lugar, a gente achava que era uma coisa, não é nada aquilo, é outra coisa. E a gente aprende muito, conhecendo pessoas. Eu acho que tem hoje uma turma, uma geração muito boa de jornalistas indígenas. Alguns já trabalharam com a gente, já escreveram matéria pra gente, como a Mayra Watsichana, que é jornalista, que foi assessora da Joênia também. Tem a Ariane Sousuí, que é também jornalista, fez uma estada recentemente, ela é uma excelente na área de comunicação de jornalista. Então, na Amazônia Real, quando a gente... Se você olhar no site, tem uma povos indígenas, que é o primeiro, que é o indígena meio ambiente. E, logicamente, o carro-chefe da Amazônia Real são povos indígenas. Alguém diz assim, mas vocês não precisam falar, só tem esse assunto, indígenas, povos indígenas e meio ambiente. Quais são as terras indígenas, quais são os territórios na Amazônia que estão protegidos, onde já tem florestas? Terras indígenas. Terras indígenas é a área de conservação que estão ameaçadas, que são pessoas que estão ali ameaçadas de morte, eles que estão protegendo a floresta, é onde já tem florestas. Então, é deles que a gente vai falar. E falar de forma como deve ser. Primeiro, tem que saber o que eles querem falar. Isso é fundamental. Isso que muitas vezes é um erro do jornalista, chegar num lugar e achar que estou aqui e vocês têm que falar, estou aqui para o bino. Não, isso daqui é falar. Fala, se não quer falar, tem que falar para as pessoas certas também. Eu não vou fazer um manual aqui, porque a terra me pediu, uma vez até já fiz isso. Como enxergar as terras indígenas, eu ajudei a fazer. Gente, não é assim, vocês não vão chegar na terra indígena, cheguei, quero fazer isso com você. Vocês também, vocês têm que pedir toda uma autorização, conversar com todas as lideranças certas, o que eles querem falar. Muitas vezes também há muitos escritores de ternas, mas se você chegar num lugar e não tem nada, aquilo que você está falando. Então, isso é importante, por quê? Porque o jornalismo, a gente trouxe essa ideia, essa imagem de que falou de um indígena que falou por todos. Eu lembro que eu fiz uma vez uma matéria sobre um povo, não, de um antiramoral mesmo, lá do Santa Tereza. Eu entrevistou um outro grupo, não tem nada a ver, não tem nada a ver com o que eu estou a dizer, eu não entendi nada, eu falava uma pessoa do povo para falar. Esse povo tem um domínio sobre aquele assunto e também ele criou muito uma imagem que na Amazônia Real e também no jornalismo ele também quis quebrar esse conceito de desbravador do jornalismo. O jornalismo tem muito isso, de desbravar, explorar. Até eu estou explorando aquele território, estou desbravando como jornalista. Cheguei, tem muito nos documentários. Isso também quis romper com todas essas lógicas porque o básico do jornalismo é chegar no lugar, ouvir, compreender, tentar compreender pelo menos, ter paciência e não ultrapassar, não chegar no tempo achando que chegou e pronto, vai embora, não já ouvi aquela liderança, vai embora. Aqui na nossa região a gente recebe muitos contatos de pedido de priorização, como chegar no maternismo. Às vezes chega pessoas, a empresa internacional que nos procura e eu disse, olha, eles já querem chegar e já querem ir lá. Não é assim, vocês já estão querendo hoje até amanhã. Olha, tem lugar que eu fui sem um ano negociando para ir lá, mas não é assim tão fácil. Eles querem que a gente vá. Às vezes eles mudam de ideia até. Então, olha lá, quando tem as que vai, não querem que a gente vá. Então, tem que ter paciência, não é chegar assim no lugar, e não é porque algo é exótico, excêntrico, não, é uma outra cultura, tem que entender que é outra cultura, outra realidade, tem que compreender as diferentes costumes, cultura, isso inclusive é uma construição. Então, muitas vezes os jornalistas querem chegar e já querem fazer batéria, ir embora, e quer dizer que tem estômago indígena, aquela coisa. Então, na Amazônia, a gente quebrou também esses paradigmas, e a gente faz isso com jornalismo. Quando a gente vai, por exemplo, fazer... Vou dar um exemplo. A última vez que eu fui para o Matheus, eu viajei, faz tempo já que eu viajei. Ah, não, faz tempo não, foi em março que eu viajei, que eu fui para a terra indígena do povo Mura, que fica aqui perto de Manaus. E eu queria ir lá, por quê? Porque o povo Mura, também isso na Amazônia Real que eu busco mostrar também, isso também é uma iniciativa minha. Porque aqui na região amazônica está uma diversidade de povos indígenas. E tem os indígenas que parecem mais, tem mais holofotes, tem mais aceleros midiáticos, tudo mais, que também são muito precisos, mas ao mesmo tempo, relevosos. Mas há muitos outros povos que ninguém fala. Imagina, na Amazônia tem, imagina, um nordeste que não fala mesmo, ou qualquer outra região. Então, eu sempre quis puxar para mim, pegar, assim, eu quis fazer uma matéria sobre povos, sobre pais, ninguém fala. Aqueles povos que são muito apagados, que muitas vezes não tem nem apoio de organização, não tem nem aliados do seu lado. Porque, não sei, pelo menos, hoje não tem apenas. Então, a última vez que eu viajei foi para a terra indígena Mura, que talvez eu gostei, eu assisto essas cursos, porque eu vi que essa matéria não é tão linda, eu vi que as pessoas não divulgam toda essa matéria. E o povo Mura é um povo que foi, não sei se vocês foram aí na história da Amazônia, o povo Mura foi um povo que foi um dos primeiros contactados durante o processo da colonização, ele invasou, isso três séculos atrás. Então, resistiram desde então, resistem até hoje. Tem uma história brilhante do povo Mura. E, no entanto, eles estão muito apagados, porque também criou-se uma... Eles são estigmatizados também, né? E eu quis ir lá, por quê? Porque há uma ameaça muito grave, né, da atividade da exploração de potássio. O Bolsonaro não queria até regularizar a mineração em terra indígena, utilizando os terras imensas. Mas, realmente, tem uma área indígena onde tem uma atividade de potássio, uma grande empresa que explora lá. E eu fui lá, fiquei lá alguns dias. E como é que a gente viaja? Vou dar um exemplo, é que você queria um exemplo do Amazonas Real. Quando eu viajo, eu sempre coloco aí umas coisas muito interessantes porque eu trabalho na Amazônia, né? A gente sempre coloca um dia a margem, a gente não coloca um dia a menos. Coloca sempre um dia a margem de cá, porque chove, às vezes o ar pode esfregar. A gente tem que também lidar com a realidade que a gente vive, né? Pode chover, a gente... Lembro que a gente foi fazer uma péria, não fui eu, foi outra equipe da Amazônia Real, uma péria onde tinha que ter um sobrevoo, uma péria de desneando humano. Que foi muito arriscado, inclusive, né? Foi um sobrevoo para identificar os garimpos lá na... Isso foi no passado, que rendeu um especial chamado Sangue do Ouro e Anão Humano. E durante três dias, quatro dias, a nossa equipe não pôde sair. Por quê? Porque estava muito nublado, porque estava chovendo, o avião podia cair, e a gente não quis viajar. Então, a gente também tem que lidar com todas essas... com esses improváveis no nosso trabalho. Então, tem dentro dos riscos, né? Como jornalista, e ouvir essas populações. E tem umas coisas também que eu aprendo também, né? Como jornalista. Por quê? A gente acha que nas comunidades indígenas, como não tem comunicação, não tem uma internet, não tem um WhatsApp, porque a gente não comunica muito pelo WhatsApp aqui, né? E também não tem... sinal de celular. Eu já fiz o trem, virou três dias, porque a pessoa só tinha a internet de noite. Aí, além de que na época da pandemia, eu entrevistei os indígenas de Porto de Cunha, que foram os primeiros que pegaram... Aqui no caso do Brasil, até, né? Foi o primeiro caso de covid. Foi numa indígena do Alto Solimões, de Porto de Cocama, e logo depois foi de Porto de Cunha. E eu entrevistei a aldeia que estava... Foi isolada, a primeira aldeia, de madrugada, porque não tinha um sinal. Foi um período em que a gente trabalhou muito em covid, na época da pandemia, né? E é sempre assim, a gente tem que adaptar a essa situação. E, no entanto, muitos indígenas, mesmo que sejam, para mim, todos são comunicadores, todos sabem se comunicar. Até mesmo quem tem internet, quem tem celular, sabe se comunicar. E muitos já se mandam, mesmo que o mais... O que está rolando? Acho que a Eliane está... Já saiu? Eu acho muito interessante, por exemplo, ter um indígena do povo Uruauauau, ele fez um vídeo para a gente. Ele veio e falou, estou aqui filmando, aqui vazou, entrou, e ele mandou para a gente, e a gente fez um vídeo, fez tipo uma edição de um vídeo, e colocou numa dona em real. A gente até recebe isso, porque muitas vezes a gente não pode nos lugares, a gente não sei como fazer. Então, isso a Amazonas em Real aprendeu e adotou essas práticas ao longo desses anos. No início não era assim. A gente foi adotando agora. Eu lembro da pandemia, eles mandam vídeo para mim, mandam e a gente coloca as fotografias. Lógico que a gente não está num momento fácil de viver, fácil para... No país, e há muitos indígenas com risco. Nós tivemos muito cuidado, por exemplo, com as lideranças indígenas, do pai de Javari, nesse período da morte, e de repente estão ficando que até hoje eu ainda me comunico com eles, falo com eles. Isso que é o diferencial da Amazonas em Real também, você já falava sobre o diferencial, a gente nunca deixou de fazer matéria, de dialogar com outras pessoas. A gente ajuda até de outras formas, mas esse não é o caso aqui. Mas assim, eu acho que é fundamental no jornalismo, quem é jornalista mesmo, está na geração de jornalistas e é novinho, ter esse trabalho, romper as concepções lógicas do jornalismo, de conceito de jornalismo distante. Isso não existe, não tem. A partir do momento que você entrevista aquela população, aquele grupo, aquela pessoa, aquele indivíduo, aquele sujeito, você mantém relação com ela até eternamente. Você vai continuar até... Ele vai continuar mandando matéria, mandando informação, mandando fatos, imagens, denúncias, e aqui a gente recebe sempre. Aqui na Amazonas em Real a gente não tem tempo para outra coisa. A gente é o tempo todo recebendo denúncias. Então, eu acho... Só para... São dois pontos que eu esqueci. Um deles é sobre as mulheres, que eu gostei de falar, eu falei no início e agora eu vou falar. Na Amazonas em Real a gente tem algumas normas, a gente tem alguns manuais, alguns protocolos. Um deles é ouvir mulheres. Todas as matérias que a gente faz, a gente tem que ouvir mulher. O básico, mulher ou negro ou indígena, mas quando a gente vai para matérias indígenas, vamos ouvir mulheres. E vocês sabem, não dá. Tem lugar de que é machista mesmo, eu não quero ter mulher de paz. Eu lembro que algumas mulheres não falam português, por exemplo, o domínio sempre é dos homens, mas eu lembro que eu fico em matéria, lá no Brasil já vai existir, eu não quero ver uma mulher, então eu vou traduzir o que ela falou para mim, porque eu vou colocar ela na minha matéria. Então, às vezes há uma certa resistência também dos homens, das lideranças indígenas, para as casas, mas a gente coloca, e isso faz parte porque é necessário dar esse espaço para as mulheres, que muitas vezes são tão pagadas, olha o exemplo da... Eu nunca sabia, por exemplo, que a Eliane estava lá participando, e nem se fala dela, já deveria ter o espaço dela. Então, e na Amazônia Real, isso é só um comentário de como é que a gente, na Amazônia Real, trabalha, falando sobre pontos de gênero, questão de gênero. E um outro fato que a gente trabalha, a Amazônia Real também não é só matéria, a gente também desenvolveu em 2018 e 2019 duas oficinas de comunicadores, que é fundamental mesmo, que eu lembro que na época a gente via muitos indígenas, os comunicadores da juventude, faziam muito selfie, se faz selfie, não faz muito selfie, então a gente falou, vamos aproveitar, eu estou na comunidade, vamos escolher as comunidades, o que está acontecendo lá. A gente realizou oficinas só para as mulheres, para as meninas em 2018, trazemos indígenas do povo Juma, por exemplo, povo Jumã, que nunca nem tinha saído do seu território, vocês sabem, o povo Jumã é um povo que só tem quatro pessoas, praticamente, não morreu, era o caio, não tem mais um homem no povo Jumã, eles que adotam o nome Juma, ou doeu ao alto. E mais uma menina do Pará, e se tem mulher só oficina, em 2019 nós fizemos só com os rapazes e algumas, e as oficinas foram criadas por indígenas, na verdade, não só fomos nós, mas também indígenas que nos trazam oficinas para os próprios indígenas, então o João Paulo Barreto, o Dalio Anomane, o Eric Serena, eles fizeram, não foi aquela pessoa branca, mas a pessoa branca ensinando o indígena. Então, eu acho isso fundamental, e eu acho que cada vez... Eu gosto muito desse termo oficina, capacitação, eu não gosto, capacitação, oficina, formação, e eu acho que a comunicação hoje já está em um outro, vou dizer isso pessoal, em um outro patamar. Hoje em dia tem muita gente avançando, falando sobre si, falando sobre a sua comunidade, porque hoje a comunicação, e o Marcos já comentou no termo que eu estava falando, esse jornalismo desenvolvido por indígenas, a comunicação, deixou de representar apenas um hélas de transmissão de informação. Ah, está acontecendo. Eu acho que a comunicação virou uma reflexão, ela está escrita hoje na luta empreendida pelos povos indígenas, contra as sucessivas formas históricas que tem até hoje de opressão. Então, eu acho que tem muita gente que ainda vê a comunicação indígena até como uma versão folclórica do jornalismo convencional, isso não é nada disso, é uma mudança no paradigma através da comunicação. Isso que vocês estão fazendo, outras pessoas estão fazendo, outros jornalistas, outros que estão viajando, mostrando o que é comunicação. Ou seja, rompeu com muitas formas, até mesmo mais inocentes, de perceber o que é comunicação. Eu acho que a Amazônia real está nesse meio, embora a gente esteja trabalhando mais com o jornalismo, e quando a gente fala jornalismo, a gente ouve de todos os lados, do indígena, do não indígena, ao opressor, entre eles, eles não falam, mas a gente faz o nosso papel. Então, é isso. Na Amazônia, realmente, a gente trabalha mais mesmo sobre o jornalismo, mostrando quem são esses povos, colocando-os com prioridade, e colocando a palavra deles lá em cima e não lá embaixo, como é muitas vezes o jornalismo que coloca nos principais. E é isso. Obrigada, meninas. E menino. Menino. É ótimo. Perfeito. Era isso que eu gostaria de ouvir e que você falou, ele compreende totalmente o ponto de vista da etnomídia em si. O João Paulo já tinha ouvido, já tinha falado com ele sobre isso, ele é crítico. É aquele momento que eu olho para cima, eu viro o olhinho, eu falo, tá, beleza, ótimo, mas você virou doutor a partir desse mesmo espaço que dá a chancela. Você tem chancela de branco para ser doutor. Então, a etnomídia precisou desse espaço também. E quando você fala sobre a etnomídia... Olha, espero que o João Paulo, depois eu queira te rebater aqui. Não, sem nenhum problema. No último encontro que a gente teve, lá no encontro de estudantes indígenas em São Paulo, no Enem, a gente virou quase uma madrugada tomando cerveja e falando sobre conceitos. A gente ficou bêbado falando sobre conceitos. E não é um problema para mim, adoro pessoas inteligentes para a gente debater. Quando é aquela coisa bem baixa, assuntos que só chega só na segunda página, eu até nem bato mais papo sobre esse assunto, não comento, não curto, não compartilho. Mas ele é um cara que eu admiro muito e faço questão de ir ao limite dos conhecimentos, tanto os acadêmicos quanto os tradicionais. A gente se fundamenta nos dois territórios. E isso é muito bom, não utiliza só a academia. Sobre a etnomia de indígena, ela foi uma produção criada e ela foi rejeitada pela universidade primeiro. Você até não sabe, mas ela foi rejeitada pelo OMB como conceito. Isso num encontro de indígenas em Bahia da Traição, na terra lá dele, em Potiguara, durante um projeto que eles queriam que eu só ensinasse os indígenas a usar câmera e gravador. Eu falei, não, vou ensinar eles a pensar em comunicação. Esse é o meu aspecto. Porque usar a câmera e gravador, você bota isso num macaco, num cachorro, você vai ter áudio e vai ter fotografia. Tem muito isso, né? Tem muito isso nas oficinas de uma organização, usar câmera, aí vai embora, sai. Como é que é? Às vezes até só pega de volta. Isso. É terrível. Pior quando traz aqueles notebooks caros para caramba, os Macs da vida, e depois vai embora e te deixa sem nada, sem equipamento nenhum e diz que te ensinou comunicação. Eu, quando eu penso sobre comunicação, quando eu levei esse pensamento da etnomídia indígena, era pensar em linguagens comunicacionais possíveis a partir do processo cultural de cada povo. Então, cada povo, a partir da sua realidade, dentro do seu território, constrói a sua comunicação. Primeiro para dentro, depois para fora. A coisa mais difícil entre a comunicação é você falar para dentro. Se você não consegue falar com o seu povo, acabou. A gente sabe muito bem, a gente lida com isso, com povos indígenas. E esse entendimento que eu tive nesses anos todos, dos meus seis anos de idade até hoje, aos meus 48, quase 50, foi sempre observando atentamente os parâmetros comunicacionais de cada coletivo indígena. Quando falo coletivo, cada nação. Como funcionava com um povo, não funciona com outro povo. Então, a etnomídia indígena nasce principalmente focada na cultura. Ela depende da cultura para construir comunicação. E aí ela constrói essa linguagem comunicacional, esse mecanismo, a ferramenta, ela se apropria do que ela quiser, seja analógico, digital ou qualquer outra coisa. Culturalmente, você constrói as comunicações, as tradições orais, como a Papiane falou, como tudo mundo... Ah, tá, como a Andila. Olha, tem momento que não dá mais para ser oral, você tem que botar para um mecanismo escrito, mas o mesmo mecanismo escrito, se não fosse em um outro período, teria matado a própria língua. A própria oralidade não cabe dentro de um livro, mas ela cabe fazer uma tradução. Porque, a parte, se você tem afeto na linguagem, você tem realmente uma tradução real, você não tem uma versão. Eu tenho uma experiência que eu sempre conto, que eu tive com o Nijuara, entrevistando os Miki, e lá naquele bate-papo com os Miki, imagine, quatro grupos de pessoas não conseguiam traduzir para mim algo que eu entendo, eu não consigo falar Miki, eu entendo Miki, mas não consigo falar. Só que aconteceu que o Neto, essa pessoa Miki, lá da região de Brasil Norte, no Mato Grosso, passou para a minha felicidade, se o Neto não consegue traduzir, mais ninguém consegue traduzir o que esse ancião está falando. E ele falou e o Neto traduziu. E naquele momento eu tive uma epifania, que toda tradução tem que haver relação de afeto, se não tem relação de afeto, é apenas uma versão sobre o que está sendo dito. Em caso dos Miki, ainda tem a questão de língua etária e de gênero. E aí quando você falou sobre a questão do gênero, do homem traduzir para a mulher, existe também esse perigo, porque dependendo da etnia, do grupo, da nação, o que o homem está dizendo não é o que a mulher está dizendo, porque o que ela diz não tem nada a ver com o que ele diz, porque é etária e de gênero. Então, até como dica mesmo, em comunicação, a experiência do tempo indígena, de ir, você vai na aldeia e fala caramba, você tem que esperar tantos dias, porque de repente o tempo parou aqui, mas acontece, de alguma forma acontece. Isso já aconteceu no meu território, na minha aldeia, no meu território de Olinda, de eu chegar lá e querer alguma coisa, e de repente a coisa parava, você fala assim, gente, não vai acontecer mais. E de repente acontecia. Então, existe o tempo indígena, tudo aquilo que você falou das estratégias, que é o manual de como acessar um território indígena, imagina que eu passei a minha vida inteira fazendo isso, e entendendo e chegando a essa atabilização, dificuldades de tempo, dificuldades. Às vezes, quando eu fui lá em São Gabriel da Cachoeira, na hora de pousar, eu olhava do avião e falei gente, eu sei que existe um aeroporto aí embaixo, aonde? Então, o avião ficava rodando, rodando, rodando, e de repente tinha um buraquinho assim na nuvem, e eu falei, olha, é aqui que a gente vai entrar e vamos segurar um pouco no teto da nuvem, dar duas voltas e achar a pista. E chegar socando mesmo na pista e as dificuldades. Então, acompanhar esse processo é muito importante. Eu fico muito feliz pelo Amazonas, principalmente você, e aí eu não vou nem trazer para a mídia, vou trazer para um indivíduo, ter essa experiência fantástica, ter a experiência etnomidiática. A terminologia, o sufixo, é só para empurrar a garganta abaixo da academia, que eles têm que nos aceitar de alguma forma. Isso mudou o cenário a ponto que isso hoje é ensinado nas universidades. Hoje se faz questão, amanhã tem uma reunião numa escola de comunicação aqui no Rio de Janeiro, que quer que eu construa um curso de extensão só para os alunos deles, para falar tipo, olha, vocês vão aprender sobre a etnomide indígena, mas vocês não podem usar isso nada, porque vocês não são indígenas. E acabou, mas vocês têm que entender a comunicação indígena, o mecanismo, como a coisa funciona. E isso é muito bacana, eu agradeço muito, sou fã mesmo. Pode não parecer a distância, o tempo, mas eu sou um observador, sou um dos caras que faz questão de botar nos filtros lá o seu nome, o nome do jornal, acompanhar, ler e saber de algo que é muito importante. Quando você falou do Javari, eu lembro que eu só conhecia muito o Javari a partir de Ibete Begonha, ouvindo a Rádio Nacional da Amazônia, de Brasília, e saber o que estava acontecendo. Era difícil achar outras informações. E a partir do trabalho de vocês, da Amazônia, hoje eu tenho outras fontes, outras formas, de saber o que está acontecendo no território, e agradeço muito. E entender essa questão de agradecimento, o tempo, tem essa pessoa fantástica também, que eu pessoalmente dispenso a apreciação interna. É uma pessoa que admiro, respeito, amo, tem uma paixão incrível, que é Olinda, do Pinambá, Olinda Moniz, do Pinambá. É prima, mas eu faço questão o tempo inteiro de dizer para um monte de gente, pode ser meu parente, se não prestar, boto de lado, se presta, faço questão de indicar cada segundo para qualquer ação, quero estar junto. Só antes de voltar a ir para a minha prima, quando você falou do lance dos Tapajós, tem os do Pinambá. A origem dos Tapajós é na região dos Tapajós e sobe até chegar o Maranhão, outro vai para a parte mais da Guiana Francesa, do Suriname, vai subindo para lá, e o outro vem pelo litoral. Então, pode ser Saterê-Mawé com o Pinambá também, só para disputar território com os mundurukus. Nada pessoal. Mas, Olinda, seja bem-vinda, que bom você estar com a gente, você poder estar com a gente e que faça parte dessa história da comunicação étnica, do jornalismo, e constrói coisas utilizando as artes, as mídias. Seja bem-vinda. A gente quer saber um pouco também da sua história, contar o que você fez, o que você está fazendo, porque o meu caso acaba virando uma saudade de casa. Olá, pessoal, boa tarde. Primeiro, agradecer muitíssimo pelo convite e estar conhecendo, mesmo que virtualmente, essas mulheres maravilhosas. É engraçado que, esses dias, eu estava procurando para um trabalho de jornalismo, porque eu estou com a equipe, e a gente estava fazendo uma reportagem para falar das mulheres indígenas que entraram no processo eleitoral, principalmente da Amazônia. Foi o recorte que fizeram para as mulheres da Amazônia. E uma das pessoas que eu pesquisei dos veículos de comunicação para a gente traçar uma parceria foi a Amazônia Real, e eu não conhecia, mas aí entrei, comecei a pesquisar, e agora estou aqui com ela, e é interessante esses fios que a gente vai se conectando e de repente você conhece pessoalmente. Mas, bom, é interessante também saber que as histórias, apesar de a gente ter passado por mulheres que são muito mais velhas do que eu, as histórias são muito parecidas. Quando você vai e vê, na verdade, a história não mudou tanto. Às vezes a gente pensa que as coisas são melhores, mas no fundo a gente vê que há lutas coletivas, há lutas individuais, e as lutas estão aí o tempo todo. Quando a Andila e a Liane falaram, eu pensei muito sobre essa coisa de como a gente defende e como isso também é tratado dentro das próprias comunidades, como é que isso vem. E aí eu lembrei de uma situação que eu denunciei, uma retirada de cascalhos do território por parte da prefeitura que não comunicava com os vizinhos, mas eu via aqueles caminhões passando, saindo, e eu pensava, estranho, toda hora saindo caminhões de cascalhos daqui, procurava saber, não estava fazendo nenhuma estrada dentro da comunidade. E em um determinado momento eu denunciei isso, isso foi parado, não foi nem em uma grande mídia. Chegou nas restórias mesmo, isso deu uma maior confusão, acabou que a Funai ficou sabendo, repreendeu isso. E em um determinado momento uma das lideranças chegava e falou que tinha que me proibir de fazer denúncia. Isso, gente, da própria comunidade. Então, é interessante como, na verdade, as coisas não mudaram tanto. Então, eu acho que o meu processo de comunicação foi para isso. Quando eu resolvi fazer comunicação foi para ver se a comunidade tinha esse espaço nessa dica mídia. Porque a gente viveu um processo, esse mesmo processo que a Andila falou mesmo, de esbulho, de território, de arrendamento, de volta para território, e ao mesmo tempo uma parte de indígenas querendo criar gado, outras que pensavam que a gente tinha que viver mais conforme a formação indígena, de maneira mais tradicional. Então, as histórias se repetem. Eu sei que não vivi o que essas mulheres viveram, mas acho que fazer comunicação hoje é isso. Principalmente quanto a indígenas, é escolher a batalha. Você vai escolher falar sobre educação ambiental, você vai falar sobre essa questão de proteção, natureza. Então, sempre é uma coisa que acaba gerando muitos conflitos, tanto interno como externo. O externo porque normalmente essas pessoas estão de olho em coisas que estão dentro dos territórios, e ao mesmo tempo dentro porque, falando a real, não é exatamente como as pessoas costumam dizer, como se os indígenas também não tivessem gente que está interessada em determinadas coisas que não é o legal para a coletividade. Então, é uma coisa muito perigosa, porque se usa dessa estratégia de que os indígenas têm que fazer exploração econômica do que tem dentro dos territórios, e isso acaba gerando muitas brigas internas. Então, acho que tem uma parte grande de comunidades que vivem isso. E, por outro lado, a gente vê que nem todo mundo mesmo, até do próprio movimento, está disposto a falar sobre determinadas situações. Então, quando eu conheci a Rádio INHANDE, que já foi cura na faca, foi também para mim uma forma de visibilizar isso e de tornar isso mais potente. Porque eu sempre fazia um blog, porque era pessoal, sempre usava minhas próprias redes sociais, e, de repente, com a Rádio INHANDE, eu encontrei, que as pessoas também dão muito valor de ter um vento de comunicação maior, então, eu encontrei uma forma também de... de uma ferramenta de tornar isso mais... dar mais visibilidade a isso. Então, acho que quando eu resolvi fazer comunicação, foi durante que eu estava tendo esse processo de retomada, e era para dar essa visibilidade. A gente estava em um processo de que a grande mídia, sempre aquela história de que os indígenas são invasores, invadiram terra, invadiram terra, e nunca se contava o que... o por trás disso, quem era esse povo, que território era esse, não se contava sobre esses títulos de terra que foram doados para fazendeiros dentro da terra indígena. Então, começou bem nessa história mesmo, de falar dessa experiência da representação. Então, toda vez que os indígenas davam entrevista para a mídia, quando saía era totalmente diferente do que se esperava. Então, eu comecei a abrir um blog, abri um blog que na época se chamava Iaot Sinambá, e nessa época eu já estava fazendo jornalismo, estava fazendo comunicação. E a partir desse momento, na verdade, acho que foi minha primeira iniciativa para falar sobre o território, para falar das questões de dentro do território. Foi minha primeira iniciativa e depois comecei a fazer. Mas acho que trabalhar com comunicação hoje, buscar os povos indígenas e com os povos indígenas é um desafio, principalmente quando você está dentro do território. Então, acho que é um desafio maior ainda, porque é uma coisa que você está muito próxima. Quando eu estou aqui, que eu vou falar das questões ambientais, que eu vou falar da arrupada de árvores, eu estou dentro do território, essa dimensão para mim é bem complicada, porque ao mesmo tempo que você está fazendo algo, você está defendendo uma coisa para a própria comunidade, tem um monte de gente que está ali, de certa forma, não gostando dessa situação. Eu também já sofri ameaça desde a Câmara de Vereadores, da Prefeitura, de que estão merecendo uma surra, tomar um chapa. Então, são coisas que vem mesmo. E tem um certo momento que dá um medo, o que vai acontecer? Mas acho que, como a Indígena falou, nessa caminhada, e não é só minha encontro com indígenas, mas acho que de todas nós que resolvemos entrar nessa área de comunicação para defender alguma coisa que a gente acredita, acho que a gente sabe que é perigoso, mas a gente tem que continuar. Hoje, penso que talvez fortalecer essa questão da comunicação também para um movimento como um todo, porque sinto, de certa forma, que essa coisa do próprio movimento de escolher o que você vai falar, de qual comunidade tem mais visibilidade, isso acaba enfraquecendo as pessoas que trabalham mais individualmente. Porque já vi muito disso também de pessoas que procuram o movimento de uma coisa maior, que se você manda para lá, talvez tivesse mais visibilidade, mais acolhimento, e as pessoas tivessem, olhassem melhor para uma questão. E, na verdade, na prática, isso não acontece. Sinto um certo... Uma certa crítica, na verdade, de como as coisas estão acontecendo para a gente também, e como as coisas estão encaminhando. Porque eu acredito que está muito além de dar visibilidade, é a gente olhar mesmo para as comunidades, é entender que, quando a gente fala em movimento indígena, a gente precisa representar as pessoas que estão na base. E, hoje em dia, fica difícil você entender isso. E as próprias comunidades. Hoje em dia, eu estava falando muito sobre essas questões políticas, coletando com o pessoal, as pessoas falam mais. Mas tem tanta gente que se candidatou aqui e não conseguiu. Eu falei, por que as pessoas não estão se preocupando em estar junto da base? Então, onde as pessoas querem se candidatar e achar que é porque é indígena que as pessoas vão dar a volta? As pessoas têm que conhecer qual o projeto dessa pessoa, de estar dentro da comunidade. E isso, principalmente aqui na Bahia, aconteceu muito. As pessoas chegassem e, de repente, eu quero... E os indígenas falaram, não, você eu não quero. Se fosse tal pessoa que vem aqui, que a gente conhece, a gente voltaria, mas tal pessoa a gente não quer. Então, eu acho que a gente, enquanto movimento também, para me fornecer todas essas coisas, precisa estar mais próximo da base. A gente tem muita coisa para ser discutida, a gente tem muita coisa para ser visibilizada. E eu estou sentindo um pouco esse distanciamento, apesar de a gente ter conseguido muito com Sonia e com Célia. Fiquei triste porque eu ainda não conseguia dessa segunda-feira. Eu acho que foi uma pessoa que representou tão lindamente os povos indígenas. Mas eu acho que é isso, o trabalho continua. A gente está aí, cada um fazendo um trabalho que é de formiguinha, mas, ao mesmo tempo, é um trabalho que traz potência e que faz a gente querer continuar na luta. Bacana! Eu tenho mais uma pergunta específica para você, Olinda. Como você atua na área de meio ambiente, comunicação, produtos, arte? Você pensa a comunicação o tempo inteiro no seu trabalho? Porque tem a Apacapora, você é cineasta, diretora, produtora, é mãe de irmão, mãe de cachorro, mãe do marido, quando eu falo porque ele é um moleque grande, o Samuka. Como você coloca a sua comunicação étnica nisso tudo? Sensibilizar, onde é que está a Pataxó, a Nha-Hanh, a Tupinambá? Eu sou admirador, sim. Eu lembro, faço questão sempre de lembrar, quando a gente se conhece, você ainda novinha, quando fez parte daquela revistazinha do Jornal Globo, que era Sinal de Fumaça Digital, e eu falava, caramba, essa menina tem potência, essa menina tem força. E logo depois que fui fazer a faculdade, eu falei, caramba, ninguém assume essa posição, ninguém faz faculdade de jornalismo, pelo menos na nossa cultura. Você é muito específico para povos indígenas, porque parece que as profissões para indígenas são restrita a educação, enfermagem, uma área de enfermagem, ser pedagogo, o nível mais alto pedagogo, durante um bom tempo era isso que se nos oferecia, mas quando ele cai na comunicação, cai no direito especificamente, hoje a gente tem mais de 400 indígenas formados em direito em todo o país, mas mesmo assim ainda não está consolidado um grupo, um pool de advogados que se uniram para um fim comum para a causa indígena. Mas a gente vê comunicadores que estão o tempo inteiro se juntando, têm suas tretas naturais, que são tretas muito mais étnicas do que tretas por motivos específicos, a gente tem uma pauta comum, que é demarcação de terra, a educação, a economia, direitos coletivos e individuais, mas na comunicação, como é que você colocou tudo isso dentro do que você faz? Você pensa nisso? Primeiro, eu acho que meu trabalho acabou que foi muito... não sei se foi desviado, mas é aquela coisa, não foi uma... eu terminei o curso de comunicação e eu queria que as pessoas se vissem, se enxergar, o pessoal da minha comunidade, porque como a gente vem sempre falando nessa questão de quem são esses povos, quem são os povos indígenas do Nordeste, e naquele cinema que era feito e que mostrava sempre indígenas da Amazônia, todo mundo moreno, de cabelo liso, nu, eu não me enxergava naquilo, e ao mesmo tempo eu sentia que o povo também não se enxergava. Então, quando eu terminei o curso, eu queria fazer um documentário, e foi o que eu fiz. Foi o meu primeiro documentário, que se chama Retomar Para Existir, que conta essa história desse cacique e das estratégias usadas para conquistar o território. Então, inicialmente não era uma coisa assim, ah, eu quero fazer cinema, era uma coisa de que eles se sentissem representativos naquilo que eu estava propondo. Em 2017, eu sou convidada, terminei em 2015, e em 2017 eu estou convidada para apresentar esse documentário no Cine Curumim. Então, a partir daquele momento, na verdade, eu percebi a potência que era trabalhar com o cinema. Então, a partir daquela... de ver o meu filme passando no cinema, as pessoas comentarem, as pessoas conversarem comigo, depois receber algum... assim, olha, Laila Linda, surgiram os editais aqui, por que você não escreve aquele roteiro que você diz que tem? E eu comecei a ir para isso. E aí escrevi, ganhei, então assim, o edital. E, na verdade, acabou assim. O que eu queria falar, que era mostrar as pessoas que elas se sentissem representadas, depois, mais... depois de 2012, quando a gente realmente consegue ganhar no SFF, essa questão da terra indígena, foi começar a pensar na questão ambiental mais fortemente. A gente já vinha pensando sobre isso, mas assim, e agora? Você conseguiu território, isso a gente pode fazer para melhorar essa situação, porque boa parte do território é devastado. Então, eu queria trabalhar com recuperação ambiental, conversar com a comunidade e falar sobre os projetos, porque eu pensava para uma área que eu estava fazendo parte, que era uma área familiar, e propôs, a partir da própria discussão que a comunidade tinha, que era de criar áreas de preservação ambiental. Então, a partir desse momento, eu converso com a comunidade, com o CACIM. E proponho que essa área que eu estava com minha família se tornasse uma APA, uma área de proteção ambiental. E, a partir desse momento, eu venho trabalhar nessa área, plantar, dar aula em gestação ambiental, receber os alunos, receber a comunidade. Então, assim, o projeto foi um projeto que surge, na verdade, de uma vontade de recuperar. Então, a partir disso, surgiram também outros filmes que falam sobre a questão ambiental. Então, Cabora, Chamada das Matas, Surja Equilíbrio. E meu trabalho, na verdade, que é de comunicação, mas acaba hoje em dia, acaba sendo muito mais para o cinema, videoarte. Eu acho que ele fala um pouco daquilo que eu penso que talvez, não sei se é, na verdade, o futuro, mas que eu acho que, pelo menos, é um... Para mim, hoje, até falar da questão ambiental, entender a importância disso, é pensar em um futuro possível para as próximas gerações, dentro da comunidade. Porque eu realmente tenho tido vários, assim, contato com vários indígenas que realmente não têm acesso à terra, que seus territórios hoje não têm nem... ainda não são nem demarcados. Tive contato recentemente com o pessoal do Guarani, de lá de São Paulo, e eu sempre achei que a gente não tinha nada. Isso porque a gente tem um território, mas um território degradado. E aí, quando eu vi o pessoal falando do Guarani de São Paulo, falando que a gente vive aqui, a gente só tem um território que é mais ou menos três campos de futebol, que ainda não está demarcado. Então, assim, eu realmente me deu aquilo de entender que, na verdade, a gente tem muito, que a gente só precisa cuidar. Claro que entendo também que não seria nem uma obrigação da gente cuidar, porque isso foi tirado da gente, o setnec, toda essa história. Mas, assim, eu acho que a gente tem que entender também que é o que a gente tem. O que a gente tem. Tem muita gente que não tem nada. Às vezes, sei que é pesada essa história também da gente, enquanto indígena, estar nessa zona que nos põe também dos salvadores da floresta, de que nós somos os guardiões, que eu acho que até o próprio movimento abraça isso, que me cansa muitas vezes, porque tem hora que cansa mesmo essa coisa de ativista, tem hora que a gente fala que queria descansar, queria ter uma vida normal, queria fazer outras coisas. Mas, assim, eu acho que é o que dá, o que a gente é. E a terra indígena, parece que a terra indígena nesse país é muito constante. Mas, sinceramente, me cansa essa coisa de achar que a gente tem que ser o guardião, porque a gente não vai salvar nada. A real, a gente não tem como salvar. O planeta, isso aí é história. Não tem como achar que salvar a Amazônia vai salvar o planeta inteiro. E eu acho que é preciso a gente acordar e ter esse esclarecimento de que tudo é importante. Eu moro na Mata Atlântica. Aqui tem uma biodiversidade nova, mas que está sendo destruída também. Eu não vejo isso sendo pautado. Eu não vejo o próprio movimento falar sobre isso. Isso também é mais uma forma de invisibilização. Então, falar também sobre a floresta, a floresta que a gente tem aqui, que é Mata Atlântica, também é falar dos povos que vivem aqui. Então, existe floresta, existe árvore para além da Amazônia. É importante também que as pessoas entendam isso. Existe povos indígenas para além da Amazônia. E eu acho que meu trabalho, na verdade, hoje, como eu estava de momento aqui, presta uma palavra para o mundo. E aí, vamos falar sobre a decolonização, decolonizar, que é a moda agora. Todo mundo fala que não quer colonizar nada, só quer o respeito e que a sociedade entenda que a gente tem que parar de enaltecer o número um. Porque enquanto a gente achar que um primeiro, uma língua é mais importante e uma civilização é mais importante, a gente vai continuar na merda. A gente tem que entender que existe diversidade, que existe multiplicidade. Como a Elayze falou, na Amazônia tem vários povos, no Nordeste também. Então, é entender essas possibilidades, entender esses outros mundos, entender que todo mundo merece estar nele. Estamos aqui, todo mundo merece estar nele. Então, eu acho que o meu trabalho é mais sentido, mais essa tentativa de conversa, de ter esse diálogo para dizer. E até mesmo que existe outros mundos além do mundo humano, pensar em outras possibilidades. Perfeito. Então, a gente já está chegando ao nosso final, a gente já começa a despedir. A Elayze já está aqui desesperada, já mandou uns 20 mensagens dizendo que precisa. E agora, vir para a floresta, brincadeira. Eu pensava que, se você está na Amazônia, você está na floresta o tempo inteiro. Em Manaus, você encontra o jacaré o tempo inteiro circulando ali do lado do Teatro Amazonas. Coisas de pessoal que está no Sudeste. Elayze, fique à vontade para... Na época da chuva, aparece mesmo. Eu achei que aparecesse, eu disse que pareça. Não, eu não acho que ela saia de Galatea. Então, eu agradeço a Ana Poaca. Eu sempre falo Ana Poaca, é Ana Poaca, né? Eu sempre erro as palavras todas. E eu agradeço pelo convite, foi um prazer, essa conversa longa. Foi ótimo, gostei de conhecer todas as meninas que já foram, a Ângela, a Atila, a Unida, a Eliane, que já foi. Gostei de saber a história de vocês, incrível, pioneiras. E só quero realmente parabenizar e elogiar. Obrigada. Nós que agradecemos. Ângela, fica aqui, manda o beijo. A tua filhota já mandou mensagem aqui perguntando. Já terminou. Falei, calma, estamos gravando. Fernanda, que manda mensagem. Tá certo. Então, Ana Poaca, obrigado pelo convite, viu? E vamos ficar guardando uma próxima oportunidade para a gente poder colocar mais as nossas histórias em dia. E vai ser muito interessante, é muito bom essa roda de conversa. Realmente, não pensando numa live, aquela coisa toda, mas uma roda de conversa que a gente possa tentar tomar um chimarrão e contar tudo o que a gente tem vivenciado. É bom para vocês, jovens, ouvir a gente. É dali que vocês partem. A gente abriu um caminho e vocês dali vão seguir adiante. Então é interessante você conhecer o passado para que ela te dê uma claridade melhor para o futuro. Um abraço a todos. Adorei conversar com essas meninas que eu não conhecia. Foi um prazer muito grande. Um abração para você, Ana Poaca. Obrigado. Até a próxima. Até a próxima. Faremos outra oportunidade de acontecer. Porque se a gente não faz, não acontece. Não vamos ter que esperar que alguém faça por nós. Ângela, minha querida, minha amada, fofa, maravilhosa, e outras coisas mais salve-salve. Deixa a tua mensagem. Muito bom estar com vocês. Foi um prazer conhecer pessoas que eu não conhecia pessoalmente, mas que eu admiro e acompanho. Sou leitora do Amazônia Real, conheço o trabalho da Olinda e admiro muito. Conheci a Ângela por informações, por outras pessoas, mas nunca estive pessoalmente com ela. Então foi uma oportunidade maravilhosa. Eu sou a única não indígena da mesa. Sério? A gente nem estava contando com isso. O coração e os parentescos todos estão firmes e a gente continua na luta. Eu, minhas filhas, todo mundo. A gente segue. A gente falou só do programa de índio lá do passado, mas tem muita coisa recente. Acho que as pessoas indígenas assumiram esse protagonismo maravilhoso, estão aí na mídia fazendo as coisas. É uma evolução maravilhosa e tem mais é que continuar a crescer. Então agradeço a oportunidade. Espero essa roda de conversa aí em volta do fogo com chimarrão. Vai ser bom. Com certeza. Pelo menos no dia 11 de novembro, sei que pelo menos um chimarrão rola entre eu e a Raquel, porque ela vai vir para o Rio para a inauguração da mostra de Etno Media, uma exposição que vai acontecer no Museu da Manhã. E eu vou tocar como DJ no dia do hip-hop, que é no dia 11, e estou lançando uma coleção de camisas, estampas, que foi criada com inteligência artificial. Um computador quântico que criou a arte a partir de determinações que eu mandei ele fazer. Então, coisas que você vai testando para fazer comunicação, para fazer arte, para gerar conceitos e provocar mesmo os outros a falarem que índio pode isso, que a gente pode fazer o que a gente quer. Então, Linda, você despede da gente e já começa agradecendo por você ter aceitado, disponibilizado e colocado essa energia fantástica de um mamonista do Pinambá. Só quero agradecer mesmo a todos e a você por ter convidado. Foi ótimo conhecer as meninas todas. E falar com a Ângela, que a gente fala, Ângela, que quando alguém fala assim, eu sou a única não indígena, falam assim, você é as traidoras do branco, como é que a gente fala que as pessoas que trabalham como indígenas são as traidoras, mas isso é uma coisa boa, viu? A gente acaba sofrendo preconceito da mesma maneira por estar junto. Perfeito. E a minha amada querida também, que é Rooster, pesquisadora, sócia, porque ela está sócia em um projeto do Banco Indígena, do Money Bank, assessoria de comunicação, é a pessoa que abre as pautas para a população indígena dentro da agência Rádio Web, na qual ela trabalha lá. Elai, você falou dos padrões. Conversando com ela, ela conseguiu mudar os padrões de construir áudios dentro de uma agência de notícias, onde mudou os parâmetros até do tempo da criação do material, a partir do aprendizado. São as dinâmicas. Passou para frente, a gente tem uma agência de notícias que agora entende quando é indígena o espaço é maior. Eu quero agradecer a oportunidade de dizer que, em breve, em que a gente terminar a gravação, a gente coloca lá na página da rádio e andei o bate-papo, porque nem sempre a tecnologia... Acho que eram tantos pesos pesados, históricos, que a internet não suportou. Não consegui botar a live em tempo simultâneo. Mas dizer que as vozes de vocês me acompanham há muitos anos já, de Olinda, de Ângela, Elaíse, de Andila, de Eliane, e para mim é um sonho ver vocês reunidas. Então, que se reúnam por muito e muito mais vezes, porque as vozes de vocês inspiram a mim e podem vir. Já estão inspirando outras mulheres também. Então, grata por tudo. Grata a você, Ana Puaca. Muito obrigada, Raquel. Perfeito. Eu agradeço a todos vocês. Obrigado pela participação. Estamos aqui em mais um programa da Rádio Iandê. E até um próximo programa com a Roda de Conversa, seja com mulheres indígenas, com homens indígenas, com pessoas indígenas e, como disse, às vezes com os traidores dos brancos que estão conosco, nos amparando, nos auxiliando, fortalecendo, e a gente consegue chegar mais adiante. Um abraço a todos. Muito obrigado. E até um próximo programa. Tchau, tchau. Você ouviu na Rádio Iandê, Etnomídia Indígena, uma roda de prosa com vozes históricas da comunicação indígena no Brasil. A apresentação e mediação, Ana Puaca Muniz Tutinambá Ransansães.

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