The speaker is discussing a research project on the economic and budgetary impacts of drug wars and prohibition policies. The project aims to provide a new perspective on the costs of these policies to society. The first stage focused on the justice system, revealing that two states in Brazil spent R$5.2 billion implementing drug policies in one year. The second stage studied the impact of frequent police operations and shootings on education, finding that students exposed to violence had lower academic performance and potential long-term income losses. The third stage, focused on health, examined the economic consequences of police actions in favelas, estimating losses of R$14 million for residents and R$2.5 million for local businesses. The project had external consultants, including a team from Fiocruz led by Francisco Ignacio Bastos. The speaker coordinated the research on health, while other coordinators oversaw different stages. The project was inspired by the work of ClƔvis and
Estou gravando jĆ”. Maravilha, maravilha. Eu queria comeƧar agradecendo o convite, o interesse de vocĆŖs. Eu acompanho... Eu acompanhava mais, nĆ©, desde que eu estava na Seu Cruz, nĆ©, porque a gente nĆ£o mede escola com tĆ©cnica. EntĆ£o, eu fiz o primeiro contato com esse universo da saĆŗde, polĆtica de saĆŗde e todo esse universo. Depois eu fui fazer graduação em ciĆŖncias sociais na UERJ e fiz mestrado lĆ” tambĆ©m. Agora estou no doutorado em ciĆŖncias sociais na UERJ. Certo.
E qual foi o seu curso, Napoli? VocĆŖ cursou o que lĆ”? AnĆ”lises clĆnicas. Na Ć©poca, chamava... Luz diagnóstica e saĆŗde. Agora eles mudaram o nome do curso, nĆ©, mas era essa coisa de anĆ”lises clĆnicas. Sim. Ć mais curiosidade mesmo. E aĆ vocĆŖ tem pesquisado essa questĆ£o, nĆ©, da violĆŖncia em saĆŗde. O que vocĆŖ tem trabalhado no seu doutorado? Ah, nĆ£o. Na verdade, o meu doutorado Ć© em outro campo da sociologia. O campo da sociologia das corrupƧƵes.
Ć um outro debate. Mas, na realidade, a gente vem com esse projeto hĆ” quatro anos, jĆ” pensando os impactos financeiros e orƧamentĆ”rios das guerras drogas e dessa polĆtica de proibição. A gente vem em um certo acĆŗmulo, nĆ©? VocĆŖ estĆ” desde o inĆcio? VocĆŖ estĆ” participando da pesquisa desde o inĆcio? HĆ” quatro anos tambĆ©m? Foi desde... A pesquisa comeƧou um pouco antes. ComeƧou em junho, em agosto de 2019. Eu entrei em setembro de 2019 aqui. EntĆ£o, praticamente desde o inĆcio, nĆ©, desse projeto.
Sim. EntĆ£o, entrando aqui jĆ” naquela extensa lista que eu passei para vocĆŖ do questionĆ”rio, queria que vocĆŖ falasse um pouquinho, jĆ” que a gente entrou nisso, tocou nisso, como surgiu a ideia de realização dessa pesquisa, quanto custa proibir, e de que forma a subdivisĆ£o temĆ”tica foi pensada. Porque vocĆŖs tĆŖm uma... Acho que a etapa dois era voltada para a educação, os prejuĆzos da educação. Essa Ć© da saĆŗde. A próxima, eu acho que seria... Eu vi uma live sua, nĆ£o sei se Ć© favela, na linha de tiro, alguma coisa assim.
Queria que vocĆŖ falasse um pouquinho sobre essa divisĆ£o e quais foram os critĆ©rios, o que vocĆŖs pensaram para fazer isso. Maravilha. Esse projeto surgiu lĆ” em 2019 com esse objetivo de trazer uma nova dimensĆ£o para esse debate do proibicionismo e da polĆtica de guerra Ć s drogas. E a partir Ć© uma dimensĆ£o do custo econĆ“mico e orƧamentĆ”rio que essa polĆtica tem. A gente, quando ouve falar de guerra Ć s drogas, a gente sempre ouve o impacto que Ć© o mais importante mesmo, que Ć© o custo social dessa polĆtica.
Ć o impacto na vida das pessoas, na morte que essa polĆtica produz, na dor e sofrimento que essa polĆtica deixa para os moradores de favelas de definir. EntĆ£o esse talvez seja... Esse Ć© o principal impacto dessa polĆtica, desse modelo de seguranƧa pĆŗblica. Mas a gente quis trazer um novo olhar para esse debate, que Ć© esse olhar talvez inĆ©dito no Brasil, que Ć© o impacto orƧamentĆ”rio e econĆ“mico que essa polĆtica tem. E aĆ esse impacto Ć© diluĆdo por toda a sociedade.
Porque na primeira etapa, por exemplo, jĆ” entrando nas etapas, a gente fez uma anĆ”lise orƧamentĆ”ria da implementação da lei de drogas pelas instituiƧƵes do sistema de justiƧa criminal dos estados do Rio de Janeiro e Tamparo. EntĆ£o quantas das instituiƧƵes gastam para colocar essa polĆtica, para colocar a lei de drogas em funcionamento? EntĆ£o esse custo orƧamentĆ”rio Ć© um custo que estĆ” diluĆdo para toda a sociedade. Porque sĆ£o essas instituiƧƵes, as polĆcias, militares, civis, MinistĆ©rio PĆŗblico, Defensoria PĆŗblica, Tribunal de JustiƧa, e Sistema Socioeducativo e JudiciĆ”rio, que sĆ£o as instituiƧƵes do sistema de justiƧa que implementam essa polĆtica, essas instituiƧƵes sĆ£o mantidas com o dinheiro dos nossos impostos.
EntĆ£o o custo, os recursos que sĆ£o gastos para implementar essa polĆtica sĆ£o distribuĆdos por toda a sociedade. Embora a gente saiba que quem paga o maior preƧo sĆ£o as populaƧƵes diretamente afetadas por essa polĆtica, sĆ£o as populaƧƵes de favelas e periferias. EntĆ£o a gente com esse projeto estragou um novo debate, um novo olhar para a polĆtica de drogas que Ć© a partir dos custos econĆ“micos que essa escolha polĆtica gera para toda a sociedade. EntĆ£o a gente estruturou o projeto em quatro Ć”reas, a primeira etapa olhando para o sistema de justiƧa e seguranƧa, a gente publicou um relatório chamado Mentira no PĆ©, que Ć© para olhar para o custo orƧamentĆ”rio de drogas.
AĆ a gente chegou nessa cifra monstruosa de R$ 5,2 bilhƵes em um ano. E tem dois estados que gastaram para implementar essa polĆtica, apenas dois estados do Brasil, que sĆ£o estados muito importantes, sĆ£o as maiores economias do Brasil e que sĆ£o referĆŖncias quando a gente estĆ” falando de polĆticas de seguranƧa pĆŗblica, sĆ£o modelos. EntĆ£o esses dois estados gastaram em um ano para implementar essa polĆtica de R$ 5,2 bilhƵes. AĆ na segunda etapa a gente olhou para a educação, tiros no futuro, que aĆ a gente fez uma pesquisa só a partir de...
Na primeira etapa a gente olhou o Rio e São Paulo, sem fazer comparação. E na segunda etapa, terceira e quarta, tiros no futuro, saúde na linha de tiro e favelas na mira do tiro, que é a quarta etapa, a gente olhou só para a cidade do Rio. Sei que você tem uma pergunta sobre isso, no final eu falo mais sobre isso, as necessidades do Rio e a possibilidade de replicação. Mas aà as outras, a gente olhou para a cidade do Rio.
EntĆ£o na educação a gente queria ver o impacto da exposição na tiroteio envolvendo a gente de seguranƧa nos resultados escolares, no aprendizado, na retorvação e no abandono. A gente comparou, a gente selecionou dois grupos de escolas, um grupo exposto a frequentes operaƧƵes policiais, frequentes tiroteios, e outro grupo semelhante do ponto de vista socioeconĆ“mico e a outras caracterĆsticas, mas que nĆ£o estava exposto a essas operaƧƵes. Lugares onde nĆ£o hĆ” operaƧƵes envolvendo operaƧƵes policiais e tiroteios envolvendo agentes de seguranƧa.
E a gente percebeu que as pessoas que são submetidas a uma rotina de tiroteios têm um desempenho escolar afetado por essas operações que fecham as escolas, assim como fecham também a unidade de saúde, e que em função dessa perda de aprendizado podem ter uma diminuição na renda futura de até 24 mil reais ao longo da sua vida produtiva. Então é uma perda no presente, é um impacto no presente, mas que tem consequências a longo prazo no futuro.
E aĆ, a saĆŗde, a gente vai falar mais detidamente, e a quarta etapa que a gente anunciou na semana passada, favelas na mira do tiro, era a gente querer medir o impacto da guerra de drogas na economia local, na economia das favelas. EntĆ£o a gente olhou pro impacto que essas aƧƵes da polĆcia causam pros moradores que sĆ£o impedidos de trabalhar, entĆ£o tem uma perda de renda aĆ, e que tem bens destruĆdos, ou danificados durante operaƧƵes, a gente ouviu muitos relatos de moradores que disseram que o caverĆ£o passou por cima do carro, passou por cima da moto, a bala que atinge a geladeira, que atinge a caixa d'Ć”gua, tudo isso tem um custo econĆ“mico nĆ©, pra esses moradores.
A gente calculou isso lĆ”, cerca de 14, a gente estudou o complexo de taperna em Manguins, nĆ©, a gente estimou uma perda, prejuĆzo pros moradores de 14 milhƵes de reais em um ano, e a gente tambĆ©m prejuizou todos os moradores de duas favelas desses territórios pra estimar tambĆ©m as perdas no faturamento, jĆ” que durante operaƧƵes os comĆ©rcios tambĆ©m fecham as portas nĆ£o conseguem funcionar com normalidade, e a gente conseguiu estimar essa perda tambĆ©m em 2 milhƵes e meio de reais em um ano.
EntĆ£o, só um conjunto de estudos que eu falei rapidamente sei que sĆ£o muitos nĆŗmeros depois a gente pode voltar com calma neles mas Ć© um conjunto, um arco de estudos que evidenciam a complexidade que Ć© e a complexidade dos efeitos de uma escolha polĆtica do Estado, nĆ©, pelo enfrentamento por operaƧƵes cada vez mais bĆ©licas, que produzem mortes e sofrimento, mas que tambĆ©m geram custos, nĆ©, pros moradores e pra sociedade como um todo. Sim, custos financeiros, nĆ©, alĆ©m de todos os problemas sociais e da própria violĆŖncia em si que a gente tambĆ©m fala.
Aqui no sumĆ”rio executivo desse terceiro, dessa terceira versĆ£o, nĆ©, da SaĆŗde na Linha do Tiro, da terceira etapa, vocĆŖ estĆ” como coordenadora de pesquisa. VocĆŖ, no caso, coordenou essa especificamente, ou vocĆŖ coordenou tambĆ©m todo o projeto as quatro etapas? NĆ£o, eu coordenei essa etapa da saĆŗde, a coordenadora geral dos projetos, e em cada etapa teve uma coordenação de pesquisa especĆfica. EntĆ£o, essa da saĆŗde eu coordenei a coordenação. Um breve depois eu queria te falar, desde o inĆcio, essa etapa da saĆŗde, em toda etapa, em todas as pesquisas, a gente contou com a com o trabalho, a parceria de consultores externos.
Nessa etapa da saĆŗde, a gente contou com o apoio de uma equipe da Fiocruz, do ICICI, liderada pelo Francisco Ignacio Bastos e a sua equipe de pesquisadores. EntĆ£o, eles foram os consultores externos, consultores tĆ©cnicos desse trabalho na Ć”rea da saĆŗde. SĆ£o muito importantes com a experiĆŖncia deles, nĆ©. Ćtimo. E aĆ foi entĆ£o com o Chico Ignacio, nĆ©, foi com o pessoal de lĆ”, do ICICI. VocĆŖs chegaram a conversar tambĆ©m com o ClĆ”vis, da ENSP, com alguĆ©m lĆ” da Escola Nacional de SaĆŗde PĆŗblica, ou, no caso, os consultores da Fiocruz, foi realmente a equipe do Francisco Ignacio.
Ć, com a Fiocruz a gente contou com a parceria mais detida e detalhada da equipe do Chico Ignacio, mas o ClĆ”vis Ć© uma referĆŖncia, nĆ©, a gente dedica o relatório a ICICI, a Ignacio, do pioneirismo e da importĆ¢ncia do trabalho dele e do ClĆ”vis nessa Ć”rea, nessa interface de violĆŖncia e saĆŗde. EntĆ£o, a gente dedicou toda a nossa pesquisa a ela, a gente dedica um capĆtulo tambĆ©m do relatório a vĆ”rios trabalhos deles. EntĆ£o, eles foram certamente uma inspiração.
EntĆ£o, a gente contou com a parceria do Chico Ignacio, essa equipe, pela tambĆ©m pela expertise deles nessa Ć”rea de drogas, nĆ©, entĆ£o a gente trabalhou mais com eles. Perfeito. E aĆ, assim, ainda pra minha segunda pergunta, nĆ©, falando mais especificamente agora sobre esse relatório que a gente vai, nós vamos nos ater mais aqui na conversa, eu queria saber com vocĆŖ se houve alguma surpresa durante esse estudo, nĆ©, eu vi os dados, tudo foi realmente chocante, mas se essa jĆ” era uma premissa, vocĆŖs jĆ” partiram desse pressuposto, na verdade, que encontrariam essa realidade, ou se alguma coisa surpreendeu vocĆŖs ao longo do caminho, ou mesmo nos resultados finais? Ć, a gente jĆ” esperava de antemĆ£o que a exposição prolongada Ć violĆŖncia, pra moradores das favelas que nós temos, vocĆŖ tem impactos na saĆŗde mental, nĆ©, a gente jĆ” tinha pesquisas da Rede ItamarĆ©, por exemplo, que jĆ” tinham mostrado esses efeitos, nĆ©, o impacto da exposição Ć violĆŖncia e, no nosso caso, Ć tiroteios, a operaƧƵes policiais que produzem impactos na saĆŗde mental, entĆ£o a gente viu, nĆ©, uma maior prevalĆŖncia de depressĆ£o, ansiedade, naquelas favelas mais afetadas, mais expostas Ć tiroteios, em comparação com outras, nĆ©, essa pesquisa tem um carĆ”ter comparativo, entĆ£o a gente selecionou seis favelas, trĆŖs expostas Ć tiroteio envolvendo agentes de seguranƧa e trĆŖs que nĆ£o registraram esses eventos, mas que eram semelhantes do ponto de vista econĆ“mico, isso era uma dimensĆ£o muito importante, entĆ£o a gente entrevistou 1.500 pessoas, em cada favela e a gente foi comparando as respostas, entĆ£o a gente conseguiu medir essa prevalĆŖncia, esse aumento da prevalĆŖncia nesses territórios mais afetados, entĆ£o isso jĆ” era esperado, Ć© um outro dado, mas o esperado sempre Ć© uma coisa chocante, Ć© um resultado chocante quando vem um nĆŗmero, nĆ©, a prevalĆŖncia somando-se Ć s quatro condiƧƵes, nĆ©, depressĆ£o, ansiedade, insĆ“nia e hipertensĆ£o, que ela, a prevalĆŖncia dela, 51% dos moradores tem alguma dessas doenƧas nas favelas mais afetadas em comparação a cerca de 36% nas outras favelas, entĆ£o essa diferenƧa chama atenção, a gente jĆ” esperava tambĆ©m que os moradores fossem relatar reaƧƵes imediatas durante tiroteios, entĆ£o a gente perguntou o que vocĆŖs sentiam durante tiroteios, nĆ©, cerca de 30% desses moradores mais expostos, relataram sentir tremor, falta de sono, falta de ar, coração salpitar 40%, a gente jĆ” esperava tambĆ©m que isso fosse aparecer, a grande surpresa talvez tenha sido esse impacto a longo prazo, nĆ©, quando a gente fez vĆ”rios modelos de regressĆ£o, a gente conseguiu estimar o risco de desenvolver essas doenƧas, esses transtornos só pelo fato de estar exposto a essa violĆŖncia, nĆ©, só por morar nesses territórios, entĆ£o esse dado de 42% de aumento na chance de desenvolver hipertensĆ£o, por exemplo, em comunidades mais expostas a tiroteios em comparação com as outras, o dobro de chance de ter depressĆ£o e ansiedade, talvez esse dado do notĆcio que as pessoas estĆ£o submetidas, talvez tenha sido aquele que mais chamou atenção da equipe durante a pesquisa, nĆ©, que jĆ” pensando na sua outra pergunta, Ć© uma pesquisa que durou mais ou menos um ano e meio, entre todas as fases, a concepção do relatório, o desenho da pesquisa do questionĆ”rio, atĆ© a seleção dos territórios, a gente nessa etapa tambĆ©m contratou uma empresa para fazer o trabalho de campo, a coleta de dados, nĆ©, que Ć© a Science, que Ć© uma empresa que jĆ” tem membros do IBGE e da ENCE no seu corpo, no seu quadro de funcionĆ”rios, entĆ£o uma equipe experiente tambĆ©m, e durou esse tempo um todo, um ano e meio, mais ou menos atĆ© a publicação do relatório, agora em agosto, e Ć© um tratado de folha, quando a gente tem o sapo de dados, a coleta de dados, depois fazer todas as anĆ”lises do relatório, entĆ£o foi isso.
E depois atender a imprensa, repercutir o relatório tambĆ©m, discutir, mas assim, Ć© muito importante que vocĆŖ fale, embora tenha sido algo jĆ” imaginado, Ć© muito importante quando a gente dĆ” materialidade a essa impressĆ£o, e dĆ” uma cientificidade, atĆ© para que os atores polĆticos possam se mobilizar, chegar com um documento Ć© muito diferente de uma impressĆ£o, de uma hipótese que a gente tenha. EntĆ£o acho que isso, a pesquisa social, ela quando traz isso, quando consegue materializar esses dados, essa realidade, pode ser um fator de mudanƧa na vida das pessoas, que Ć© o que mais impacta nesse caso, fazendo essa observação.
JÔ mais uma vez, inclusive, parabéns pelo trabalho de vocês. Então, a gente seguindo aqui, deixa eu ver no item 4, por exemplo, durante a pesquisa de vocês, você destacaria alguma situação marcante, algo que mais tenha, que você lembre que tenha te impactado de alguma forma durante o trabalho, durante essa pesquisa, a gente fala um pouco sobre o resultado em si, qual o resultado que mais destacou, mas na sua experiência, no desenvolvimento desse trabalho, teve alguma situação mais marcante que você destacaria? Uma conversa com alguém? Alguma situação presencial? Uma surpresa pra gente, uma surpresa não tão boa, foi a dificuldade que a gente teve pra obter dados pra saúde.
A gente a primeira, sei lĆ”, os primeiros seis meses do projeto foi essa pesquisa especificamente, foi detalha com o ComitĆŖ de HĆ©lice da Prefeitura, a gente teve um projeto, recolheu todos aqueles documentos, submeteu ao comitĆŖ, o que a gente precisava, no inĆcio, a gente queria obter dados dos atendimentos das unidades de saĆŗde, das unidades bĆ”sicas de saĆŗde, clĆnicas da famĆlia, centros municipais de saĆŗde, a gente queria dados tambĆ©m do acesso mais seguro, que Ć© esse programa implementado, desenvolvido pelo ComitĆŖ Internacional da Cruz Vermelha, junto com a Secretaria Municipal de SaĆŗde, que Ć©, na verdade, um programa pra gestĆ£o de risco, mitigação de risco, durante confrontos armados, durante operaƧƵes policiais, enfim, e esse programa, eles tĆŖm um sistema de cores que orienta o funcionamento da unidade de saĆŗde, a gente queria entĆ£o esses dados pra saber quantas vezes as unidades de saĆŗde fecharam, em função da violĆŖncia, e a gente queria outros dados das unidades de saĆŗde, como atendimentos, proporção de pessoas com hipertensĆ£o, por exemplo.
Dados do funcionamento das unidades de saĆŗde. EntĆ£o, a gente entrou com o ComitĆŖ JĆ©ssica e foi um processo muito demorado, de muitas indivĆduas, muito burocrĆ”tico, e no final das contas, a gente nĆ£o conseguiu ter acesso a esses dados oficiais, por isso a gente a nenhum dado, assim, por unidades de saĆŗde, a gente conseguiu os dados agregados do acesso mais seguro, a gente sabe quantas unidades de saĆŗde fecharam em 2022, mas a gente queria justamente esse dado, esse olhar pro micro, e a gente nĆ£o conseguiu.
A gente achou que, bom, ter pesquisadores renomados da Fiocruz fosse facilitar esse processo, mas infelizmente houve muitas barreiras, então a gente teve que ir pra tipo pro Samber mesmo, né, esse dado, por exemplo, tipo informando unidades que a gente queria, como a gente não conseguiu, uma alternativa foi perguntar pros moradores quando foi a última vez que a unidade de saúde tinha fechado, pra esse dado que a gente usou pra, até pra calcular o custo desse fechamento, mas esse dado a gente sabe que ele não é dos melhores, porque ele depende da memória das pessoas, então ele não é o mais preciso, mas foi o que a gente conseguiu, dada a recusa na disponibilização desses dados pela Prefeitura do Rio, pela Secretaria Municipal de Saúde, então talvez isso tenha sido uma coisa negativa que a gente teve ao longo desse processo, talvez isso até atrasou a pesquisa mais do que a gente gostaria.
Certo. E eles davam alguma explicação ou simplesmente nĆ£o tinham esses dados pra fornecer pra vocĆŖs, ou eles justificavam ou faziam novas exigĆŖncias? Basicamente eles falavam que era um dado sensĆvel, que poderiam explorar a privacidade dos gestores, dos diretores das unidades, e a gente sempre explicava que a gente nĆ£o ia revelar o nome da unidade de saĆŗde, esses dados seriam anĆ“nimos, a gente nĆ£o queria dados de nomes das pessoas presentes, eu queria saber quantas vezes uma unidade de saĆŗde fechou, e essa informação hoje em dia, a subpave, que Ć© a Subsecretaria de Atenção PrimĆ”ria da Secretaria Municipal de SaĆŗde, eles disponibilizam em tempo real essa informação, as cores, o acesso mais seguro, se vocĆŖ viveu, se vocĆŖ estĆ” vivendo, quais sĆ£o as unidades que fecharam, qual era a cor do alerta, mas eles nĆ£o davam esses dados pregressos, eles diziam que a gente tinha que pedir uma autorização para todos os gestores, uma assinatura de todos os gestores das unidades, para liberação desse dado que era inviĆ”vel, o Rio tem mais de 260 pincas da famĆlia, a cidade do Rio, entĆ£o imagina pegar a assinatura de todos eles, entĆ£o a gente acabou indo por essa alternativa de perguntar isso para os moradores, quando a unidade de saĆŗde tinha fechado, quantas vezes, as limitaƧƵes que esse tipo de dado tem.
E a adesão dos trabalhadores, foi boa, foi tranquila, vocês conseguiram fÔcil ou tinha muita resistência na pesquisa, depois que vocês explicavam, vocês conseguiam entrar com facilidade ou encontravam resistência também para conseguir esses 250 entrevistados em cada localidade? Ah, isso foi relativamente mais fÔcil, porque a gente, muitos dos comentÔrios sobre essa pesquisa de campo, trabalho de campo especificamente, a gente foi a todas as associações de moradores, conversou com os presidente, explicou a pesquisa, até com uma questão de segurança da equipe, porque essa pesquisa precisa de um ciclo luxo no entorno dessas comunidades, então tinham três pesquisadores em cada Ôrea, que estavam nas entradas das comunidades, pegando as pessoas que estavam passando ali, então conversou com associação, a gente formalizou com eles, e aà foi mais fÔcil, até que esse trabalho todo durou um mês, essa coleta de dados, porque a gente tinha também essa equipe da Science, que é uma equipe jÔ experiente, estÔ acostumada a fazer pesquisa desse tipo, serve em ponto de fluxo, e abordar as pessoas, então foi relativamente sem problemas.
O estudo, ele se baseia em operações policiais, em tiroteios decorrentes de ações do Estado, e a gente vê até um certo paradoxo, de que o Estado, que na verdade deveria proteger a população, muitas vezes coloca essa população em risco. à claro que a Science estÔ no ambiente, eu não sei, inclusive vou também fazer pergunta para vocês de como é que tem sido a repercussão da pesquisa, se vocês têm recebido algumas coisas, ouvidos, pessoal que costuma dizer aquilo que a gente trabalha para desfazer, que é a questão de que, por que não vai estudar, investigar o tiroteio dos bandidos? Disputa de facções, tudo.
Eu normalmente costumo responder, bom, porque o dever de proteger Ć© do Estado, desde que a gente espera, esperar disso de outros poderes paralelos Ć sociedade. Enfim, e aĆ o Estado, que ele tem essa função de proteger, muitas vezes por essa polĆtica, atĆ© vocĆŖ abordou isso no inĆcio da nossa conversa, vocĆŖ iniciou essa questĆ£o da polĆtica do combate Ć s drogas, que Ć© o que sustenta todo o estudo, toda a pesquisa de vocĆŖs, ela gera isso, esse enorme efeito colateral que Ć© colocar as pessoas em vulnerabilidade, e para alĆ©m daquilo, para as pessoas que realmente sĆ£o alvejadas ou que ficam sem os serviƧos, existe esse outro passivo, esse passivo da saĆŗde mental que fica e que realmente nĆ£o se fala, e que sĆ£o, de alguma forma, sequelas ou traumas produzidos pelo próprio Estado.
E Ć© uma situação realmente muito difĆcil, um pouco daquela pergunta 5 que eu tentei construir, de como Ć© que vocĆŖs avaliam isso, aquele que vocĆŖs fizeram, se falassem um pouco sobre esse acĆŗmulo que vocĆŖ falou, desse modelo de seguranƧa pĆŗblica, como isso poderia ser feito, e comentar um pouco essa situação mesmo, de como o Estado acaba, por essa estratĆ©gia, colocando as pessoas em situaƧƵes de dificuldade de vida, como o estudo aqui demonstra, que vocĆŖ comentasse aĆ um pouquinho isso tudo que eu falei.
Ć, vocĆŖs jĆ” antecipou bastante das minhas respostas, porque, se a pessoa me perguntar o que tipo de crĆticas vocĆŖs recebem, a gente diretamente nĆ£o recebe crĆticas negativas nas nossas redes sociais, a gente divulga, a gente nĆ£o recebe crĆticas negativas, nĆ£o tem recebido atĆ© entĆ£o, mas quando o resultado Ć©, por exemplo, quando as pessoas saem em grandes veĆculos de comunicação, eu sempre vou olhar as matĆ©rias e vou nos comentĆ”rios, e um dos pontos dos comentĆ”rios Ć© justamente esse, ah, mas a gente sempre fala, tirotete envolvendo a gente de seguranƧa, operaƧƵes policiais, aƧƵes da polĆcia, entĆ£o, as pessoas respondem assim, ah, os policiais tem que se envolver mesmo, nĆ©, tem que, essa Ć© a ação da polĆcia, ou ah, outro comentĆ”rio que vocĆŖ falou, ah, mas estrangeiros tambĆ©m trocam tiro dentro de aid, essas coisas que a gente acaba subparando em comentĆ”rios dessas publicaƧƵes, e aĆ a gente tem que lembrar, exatamente o que vocĆŖ lembrou, a polĆcia, a polĆcia militar, a polĆcia civil do Rio de Janeiro, sĆ£o instituiƧƵes pĆŗblicas, nĆ©, que tem o dever constitucional de proteger, de oferecer seguranƧa pra população, pra todos os civis, pra toda a população, nĆ£o só pra uma parte, eu brinco que o lema da polĆcia militar do Rio de Janeiro Ć© servir e proteger, mas quem eles protegem, quem eles servem, necessariamente, nĆ£o sĆ£o as populaƧƵes favelas e periferias, que sĆ£o tidos como inimigos, que sĆ£o alvos dessa polĆtica, nĆ©, e a gente vĆŖ, Ć© muito revoltante, pareceu mĆnimo, a gente vĆŖ esse discurso legitimado tambĆ©m pelos governantes, pelas autoridades, pelos chefes, dos poderes executivos, no Rio de Janeiro, ao longo dos anos, a gente vĆŖ, eu lembro do SĆ©rgio Cabral, em 2007, dizendo que as favelas eram bunker de bandido, ou vĆcio, dizendo que tem que mirar na cabecinha e atirar, e todo esse discurso de, ah, ele fez colateral, a gente vai agir assim mesmo, se morrer um ou dois, faz parte desse processo, entĆ£o, isso Ć© muito, isso Ć© um fracasso, nĆ©, de um modelo de seguranƧa pĆŗblica, que nĆ£o protege a população, que tem, que executa, na prĆ”tica, uma polĆtica de morte, nĆ©, a gente tem no Rio de Janeiro uma polĆcia que, no mĆnimo, nos Ćŗltimos cinco anos, tem matado mais de mil pessoas por ano, entĆ£o a gente, a gente, a sociedade, acabou naturalizando esses nĆŗmeros e esquecendo que a gente tĆ” falando de vidas, nĆ©, que sĆ£o aqueles nĆŗmeros que simbolizam vidas, sonhos, projetos interrompidos, em função dessa polĆtica de seguranƧa pĆŗblica que nĆ£o protege os seus cidadĆ£os, que nĆ£o garante direitos e que nĆ£o preserva vidas, isso que deveria ser uma polĆtica de seguranƧa democrĆ”tica, cidadĆ£, nĆ©, que deveria garantir direitos e preservar a vida, a gente, na verdade, no Rio de Janeiro, vĆŖ o extremo oposto disso, nĆ©, alguns grupos desprivilegiados, os brancos, os moradores das partes altas das cidades, esses sĆ£o protegidos, mas a imensa maioria, a população, moradores de favelas, majoritariamente negros, sĆ£o alvo dessa polĆtica de morte, nĆ©, entĆ£o isso Ć© muito preocupante e revoltante, para ser o mĆnimo.
E outro agravante que Ć© uma polĆtica setorizada, nĆ©, esse combate essa polĆtica ou esse combate direto Ć© feito dessa forma nas comunidades, nĆ©, em outros CEPs, a gente sabe que a atuação nĆ£o Ć© dessa forma, Ć© por isso que mais uma vez, estudos como esse de vocĆŖs sĆ£o extremamente relevantes. E Ć© assim que a gente acabou tambĆ©m, nĆ©, na questĆ£o 8, que justamente eu falava um pouco sobre isso, de como furar a bolha, de como conseguir sensibilizar essas pessoas que ainda tem esse tipo de pensamento, esse tipo de discurso, de que Ć© importante olhar pra isso como uma crĆtica e nĆ£o simplesmente endossar, porque Ć© muito fĆ”cil vocĆŖ ir longe, nĆ©, nĆ£o viver essa realidade.
A gente trabalha ali no território, né, da Maré, de Manguinhos, que é onde fica Fiocruz, e a gente passa o dia ali, e de vez em quando tem, né, as operações policiais, no tiroteio, só que a gente pode sair, né, a gente estÔ ali temporariamente, mas assim, você pensar as pessoas que estão ali, né, sem opção, porque vivem, e a forma, muitas vezes, realmente autoritar e arbitrar é que as pessoas que não passam nem perto dessa realidade não imaginam como é.
EntĆ£o, assim, realmente, eu entendo que pesquisas... deixa eu só... e voltou, nĆ©, tocou aqui, desculpa. Que pesquisas como essa talvez, nĆ£o sei, de alguma forma ajudem, acho que ainda tem gente que realmente Ć© nĆ£o informada mesmo, e eu nĆ£o sei se vocĆŖs pensam em estratĆ©gias, um pouco disso tudo que a gente conversou, de como fazer para que essas pessoas tambĆ©m entendam, nĆ©, aqueles que ainda querem refletir, que ainda querem ao menos criticar o modo de pensar, a partir desses resultados, se elas podem pensar diferente, nĆ£o sei, vocĆŖ tem alguma ideia sobre isso, de como a gente consegue dialogar com essas pessoas? Ć, a gente, o que eu estou com essa condição, nĆ©, de que eu estou vendo pessoas que nĆ£o se sensibilizam mais com a dor dessas famĆlias, com o sofrimento dessas famĆlias, que perdem seus filhos, que perdem seus netos, seus amigos, por essa violĆŖncia, por essa violĆŖncia que Ć© provocada pelo Estado, que Ć© uma escolha polĆtica do Estado, entĆ£o, muitas pessoas nĆ£o se sensibilizam mais com esse nĆŗmero de, ah, a polĆcia mata todo ano mil pessoas no Rio de Janeiro, eles vĆ£o dizer, ah, bandido bom Ć© um bandido morto, as pessoas nĆ£o se sensibilizam.
A gente tambĆ©m Ć©... a gente quer ultrapassar esse tom da denĆŗncia que Ć© importante, essa polĆtica Ć© racista, o Estado age assim, apenas em territórios majoritariamente negros, hĆ” venda e circulação de drogas e consumo de drogas em toda a cidade, mas Ć© apenas nas favelas que a polĆcia age dessa forma, isso era estimado pelo racismo. Essa denĆŗncia Ć© importante, a gente faz essa denĆŗncia, mas muitas pessoas nĆ£o se sensibilizam mais com isso, entĆ£o a nossa alternativa de sensibilização desse outro pĆŗblico foi investir nos custos orƧamentĆ”rios e econĆ“micos, entendeu? Bom, essa polĆtica que Ć© inevitĆ”vel, que produz mortes, dores e sofrimentos, ela tambĆ©m Ć© muito cara e a toda sociedade passa esse preƧo, entĆ£o, quando a gente mostrou 5,2 bilhƵes, Ć© diluĆdo pela sociedade, claro que tem custos que sĆ£o na quarta etapa, por exemplo, sĆ£o custos pros moradores, mas na saĆŗde, quando a gente fala, bom, as unidades de saĆŗde desses territórios fecharam, desses territórios mais dispostos Ć doenƧa, fecharam em mĆ©dia 3 dias a mais em comparação Ć s unidades de saĆŗde dos outros territórios, isso teve um custo pro Estado de 317 mil reais por ano, entendeu? Bom, entĆ£o esse dinheiro estĆ” saindo da contribuição de toda a sociedade, esse dinheiro poderia estar sendo investido em outras Ć”reas, saĆŗde, educação, gerosim de renda, emprego, e ele estĆ” sendo desperdiƧado nessa polĆtica que nĆ£o atinge seus objetivos, seus objetivos declarados a princĆpio, que Ć© a redução do comĆ©rcio, da circulação, do consumo de drogas, essa polĆtica nĆ£o atinge esse objetivo, que pelo menos Ć© o objetivo declarado dela, nĆ£o Ć© objetivo impedido, mas Ć© muito caro, entĆ£o a gente foi por esse caminho, dos custos econĆ“micos e orƧamentais, para tentar sensibilizar essa parcela da população que nĆ£o estĆ” preocupada com as vidas de saĆŗde indĆgena.
Acho que essa é uma estratégia para sensibilizar as pessoas. E aà você também nessa resposta, acabou comentando falando um pouco sobre a questão que seria a nossa sétima pergunta, falando especificamente sobre atendimento de saúde, o impacto porque eu sei que é um dos pontos também da pesquisa, a pesquisa também aponta esses impactos de fechamento de unidades de saúde, e aà eu queria que você comentasse um pouco a partir do que vocês também conseguiram levantar, como as ações de violência com participação de agentes do Estado impactam atendimentos de saúde da população e também como elas se refletem na qualidade desse serviço, que é ofertado por profissionais que também são afetados por esse contexto, ou seja, profissionais muitas vezes estressados ou assustados, enfim, a gente sabe que as condições de trabalho acabam não sendo as mais adequadas nesses territórios também, dependendo de como esteja ali o ambiente.
Eu queria tambĆ©m que vocĆŖ falasse um pouco desse outro aspecto tambĆ©m da pesquisa, que Ć© focado nessa questĆ£o do atendimento de saĆŗde. Ć, tem um impacto, um super impacto, nĆ©, dessas operaƧƵes policiais, tem um impacto no adoecimento da população, eu estava ouvindo um grito, um impacto no adoecimento, o impacto no risco de adoecer e o impacto na oferta do serviƧo de saĆŗde. EntĆ£o, a gente sabe que assim como as escolas fecham, as tempos da famĆlia que estĆ£o nos territórios, tambĆ©m fecham.
Uma das comunidades pesquisadas foi Manguinhos, CHP2 e ex-torvala, onde a gente entrevistou moradores de Manguinhos também. A gente perguntou sobre a oferta de saúde, três coisas, né, se a unidade de saúde jÔ tinha fechado, quantas vezes, se a própria pessoa jÔ tinha deixado de ir a uma consulta em função da violência, das operações policiais, e se o médico jÔ tinha deixado de ir a trabalhar. E esses dados talvez sejam as maiores diferenças entre as duas comunidades.
Esse impacto na oferta de serviço de saúde. Então, cerca de 60% dos moradores das comunidades mais expostas a tiroteios disseram que a unidade de saúde jÔ fechou, pelo menos uma vez nos últimos 12 meses, em comparação com cerca de 13% dos moradores das outras comunidades. à uma diferença muito grande. E 30% deles também disseram que o médico jÔ deixou de ir, e que ele próprio não conseguiu se deslocar. Por isso, nem o morador consegue sair de casa, nem o ACS também, que é o morador do território, nem o saúde, enfermeiros, médicos, técnicos de enfermagem, conseguem chegar ao território.
EntĆ£o, Ć© um impacto imediato, Ć© aquele impacto mais visĆvel da oferta de serviƧo de saĆŗde, que tem consequĆŖncias no adoecimento dessa população. A gente sabe tambĆ©m que nesse contexto, os profissionais de saĆŗde adoecem. Ć uma dimensĆ£o, infelizmente, que a gente nĆ£o conseguiu medir na pesquisa, em função dessas barreiras, seria um outro trĆ¢mite solicitar a entrevista da profissional de saĆŗde, seria mais complexo, mas a gente sabe que esses profissionais tambĆ©m estĆ£o sobrecarregados, que adoecem nesse contexto de violĆŖncia, nessa exposição Ć tiroteia, mas a gente conseguiu medir esses impactos na oferta de serviƧo de saĆŗde que tem um custo.
Então, como o fechamento da unidade de saúde tem um custo para o Estado, assim como o tratamento dessas doenças que são provocadas pela exposição à tiroteia, que foi uma outra coisa que a gente mediu, e o crescimento, como o crescimento impede que as pessoas trabalhem, isso também tem um custo, que é a perda da renda desses moradores. Então, essas dimensões, os custos financeiros que a gente conseguiu estimar, também, além desses impactos no adoecimento e na oferta de serviço de saúde, tem um custo que essas dimensões acabam gerando para a sociedade.
Sim. E, jĆ” caminhando aqui para o final da conversa, eu queria, vou juntar aqui duas perguntas, na verdade, falar um pouco sobre o que pode ser feito de diferente, que outras estratĆ©gias ou que outras medidas podem ser tomadas para que essa polĆtica seja feita e funcione efetivamente de outra maneira, que nĆ£o vulnerabilize tanto essas pessoas, essa população, e falar um pouco dessa conversa que nós tivemos com a Minay, quando ela cita uma fala do Beltrame que dizia que o Estado nĆ£o poderia entrar só com a forƧa policial nas comunidades, mas que tinha que trazer os outros determinantes sociais da saĆŗde.
E aĆ, enfim, ela atribui, inclusive, a nĆ£o conjunção dentro desses fatores, o fracasso da polĆtica das UPPs, que tambĆ©m Ć© bastante polĆŖmica, mas eu queria que vocĆŖ tambĆ©m comentasse um pouco essa questĆ£o de a carĆŖncia de serviƧos ou de suporte que o Estado muitas vezes fornece, quando ele entra numa comunidade apenas com a forƧa policial, que outras oportunidades ela deixa de dar, que outras demandas ele, o Estado, ele deixa de atender tambĆ©m, e como vocĆŖs avaliam, como vocĆŖ, tambĆ©m como pesquisadora, como cientista social, entende essa, digamos assim, essa inação do Estado em vĆ”rios outros determinantes e entrar apenas com a forƧa policial ali, com uma questĆ£o de seguranƧa que, na verdade, Ć© muito mais seguranƧa para quem estĆ”, uma suposta seguranƧa para quem estĆ” fora da comunidade do que para quem estĆ” dentro.
E o que pode, e aĆ junto com aquela outra questĆ£o, do que poderia ser feito de diferente por parte dos poderes. A MinĆ”rio Ć© sempre muito atentiva nas suas colocaƧƵes, acho que ela tem muita razĆ£o quando ela aponta essa crĆtica. A gente ouve um certo discurso de que o Estado estĆ” ausente nas fabelas e isso Ć© muito controverso porque o Estado se faz presente todo dia, mas com seu braƧo armado. Só com a sua ponta, com seu braƧo armado as instituiƧƵes de seguranƧa.
EntĆ£o, isso Ć© muito limitador e nĆ£o resolve o problema. Aquelas pessoas, elas precisam de emprego, de educação, de saĆŗde, de qualidade. Precisam, basicamente, de pessoas direitas e asseguradas. EntĆ£o, o Estado precisa garantir que as pessoas tenham acesso Ć saĆŗde, educação, prazer, geração de renda, emprego. O problema de seguranƧa pĆŗblica no Rio de Janeiro hoje, ele Ć© complexo, ele Ć© muito disfacetado mesmo. EntĆ£o, nĆ£o Ć© uma solução simples de operaƧƵes policiais que vĆ£o resolver ou atĆ© ocupaƧƵes territoriais, como foi a OPP, a ocupação da polĆcia nos territórios.
Isso, os indicadores criminais e atĆ© a letalidade policial diminuiu por uns anos, mas depois voltou a crescer. Ou seja, mostrando que esse problema Ć© muito mais complexo alĆ©m de uma ação isolada das forƧas de seguranƧa. Pra resolver esse problema, a gente precisa de uma ação coordenada entre vĆ”rios órgĆ£os do Poder PĆŗblico, pra oferecer direitos a essa população que Ć© sempre marginalizada, que sempre Ć© criminalizada por morar nesses territórios. EntĆ£o, acho que Ć© por aĆ, mas de imediato, isso Ć© um plano a longo prazo que tem investimento nessas Ć”reas de educação, saĆŗde, seguridade social, geração de renda, isso Ć© um plano a longo prazo e Ć© uma mudanƧa de paradigma mesmo, dessa lógica que a gente tem hoje que Ć© uma lógica bĆ©lica pra essa outra lógica que Ć© garantia de direitos, que Ć© uma lógica, de fato, democrĆ”tica e cidadĆ£.
Então, isso é a longo prazo, mas a curto prazo, a gente tem que exigir que as instituições cumpram o seu papel constitucional. Um exemplo disso é o Ministério Público, que tem, por dever constitucional, fazer o controle externo da atividade policial e o IP tÔ fechando os olhos pra essa atribuição. Então, a gente vê operações policiais cada vez mais letais, cada vez mais bélicas, todos os anos, repetindo, a gente é um IP de fato, cumpre o seu papel.
EntĆ£o, a gente sempre fala muito das polĆcias que estĆ£o ali na ponta, mas a gente tem que olhar pra todas as instituiƧƵes, o sistema de justiƧa criminal, o MinistĆ©rio PĆŗblico, os juĆzes que estĆ£o ali prendendo, que estĆ£o ali conferindo as sentenƧas, a gente tem que olhar pra todas as instituiƧƵes, um cenĆ”rio que a gente tem hoje, nĆ£o só de letalidade, mas de encarceramento tambĆ©m, da juventude negra, perifĆ©rica, a gente tem que olhar pra todo esse cenĆ”rio, nĆ£o dĆ” pra ver que essas instituiƧƵes sĆ£o unidas, essas instituiƧƵes sĆ£o colidentes, por essa missĆ£o, sĆ£o colidentes com esse modelo de seguranƧa pĆŗblica, que Ć© um modelo que só Ć© cada vez mais ofensivo, idĆ©lico e menos que menos garante direitos.
EntĆ£o, a gente, acho que Ć© um pouco por aĆ, Ć© um milagre muito assertivo na sua colocação. E aqui a nossa dĆ©cima questĆ£o, a gente estava, no inĆcio tambĆ©m vocĆŖ chegou a comentar sobre essa questĆ£o de possibilidade de replicação desse estudo, pelo menos da metodologia que vocĆŖs fizeram em outras localidades, recentemente o anuĆ”rio estatĆstico de seguranƧa pĆŗblica, a Ćŗltima versĆ£o que foi lanƧada, eu estava dando uma consultada e vi que muitos municĆpios da Bahia acabam liderando tambĆ©m o ranking de violĆŖncia e de cidades com maior nĆŗmero de homicĆdios por uma certa taxa de habitantes, que Ć© na Bahia, acaba sendo o primeiro, dos dez primeiros tem os quatro municĆpios da Bahia, pelo que eu estou lembrando de cabeƧa.
EntĆ£o, Ć© uma realidade que outros estados, outras localidades tambĆ©m vivenciam. E a ideia, uma possibilidade desse estudo de vocĆŖs, seria tambĆ©m ele poder ser replicado, servir de uma, referĆŖncia com certeza ele vai ser, mas algum tipo de matriz ou o que vocĆŖs pensam com isso? JĆ” tem observado se tem alguma coisa semelhante em algum outro lugar do Brasil e o que ele pode inclusive incentivar outros órgĆ£os, outros locais a fazerem um levantamento semelhante. Ć, essa quatro etapas que a gente estĆ” invocando desde 2019 com essa ĆŖnfase no custo orƧamentĆ”rio, econĆ“mico, da previsĆ£o da lei de drogas, da previsĆ£o das drogas, Ć© uma iniciativa inĆ©dita no Brasil, esse modelo jĆ” foi feito em alguns outros paĆses, Estados Unidos, Inglaterra, que o econĆ“mico do custo da guerra das drogas no Brasil Ć© uma iniciativa pioneira mas Ć© perfeitamente replicado em outros estados que estĆ£o tambĆ©m marcados por essa atuação da polĆcia sobretudo Bahia e Fortaleza que tambĆ©m Ć© um nordeste que tambĆ©m tem facƧƵes, vĆ”rias facƧƵes disputando o território, o controle do território e a polĆcia agindo ostensivamente nesses territórios.
Então, pelo menos nesses dois casos a gente consegue replicar essas etapas da saúde, da educação, dos territórios, ter a etapa do orçamento a primeira, aà a gente consegue replicar para o Brasil todo, porque a gente precisa de dados das instituições, do orçamento das instituições e a gente cria indicadores para tentar medir do trabalho das instituições qual percentual desse trabalho dedicado à implementação da lei de drogas. A primeira etapa é mais fÔcil de replicar. A gente só conseguiu agora, para replicar as pesquisas nos estados é preciso que haja dados de qualidade e essa também é uma dificuldade permanente do projeto.
NĆ£o só de conseguir dados pĆŗblicos mas que esses dados sejam de qualidade que a gente consiga trabalhar com essas informaƧƵes. A gente sempre aqui no Rio de Janeiro, por exemplo a polĆcia militar nĆ£o sabe ou nĆ£o forneceu para a gente. Quantas operaƧƵes continuam e os locais onde essas operaƧƵes ocorrem. Esse dado nĆ£o Ć© disponibilizado de forma pĆŗblica. EntĆ£o a gente teve que usar como alternativa os dados do Fogo Cruzado que Ć© essa plataforma que monitora os disparos de arma de fogo e aĆ tem tambĆ©m monitora tambĆ©m dĆ” uma indicação se esses disparos ocorreram com a presenƧa de agentes pĆŗblicos, agentes de seguranƧa ou nĆ£o.
A gente estĆ” utilizando esses dados aqui no Rio de Janeiro e eles jĆ” tem dados tambĆ©m para Pernambuco, Bahia e BelĆ©m. EntĆ£o a gente com esses dados consegue operacionalizar esse dado de operação policial que a gente nĆ£o tem. Os estados geralmente nĆ£o divulgam a informação. NĆ£o sei se na Bahia como Ć© que estĆ”. Fortaleza a gente chegou a tentar mas nĆ£o conseguiu tambĆ©m com a Secretaria de Prato PĆŗblico lĆ”. EntĆ£o a gente tem uma dificuldade que Ć© acertar os dados para conseguir replicar essa pesquisa mas certamente a Bahia jĆ” estĆ” no nosso cenĆ”rio e com os dados agora de tiroteio a gente consegue ter um parĆ¢metro para medir a atuação da polĆcia nos territórios.
Interagir no território, fazer pesquisas em favelas, feixerias de lÔ também. Sim. Perfeito. Então assim, Mariana, eu estou extremamente satisfeito com o que a gente conversou com os esclarecimentos, trouxe muitas informações. Eu queria saber se você teria algo mais a destacar que de repente a gente deixou de abordar e que você também considera importante aqui. Eu não entrei muito na metodologia dos resultados em si porque estÔ no estudo, eu jÔ li jÔ tenho essas informações aqui e quis conversar um pouco mais de outras curiosidades que acabei tendo durante a própria leitura.
E aà eu queria saber de você, se teria algo mais que você acha que de repente faltou a gente abordar e que você também gostaria de falar. Seja à vontade. Eu também estou muito feliz que ele agradeceu a oportunidade de falar mais sobre esses dados e ser feliz de saber que vocês vão fazer uma reportagem sobre isso. Acho que é isso, e quanto mais mais essa pesquisa, esses dados chegarem, mais a gente consegue sensibilizar as pessoas para esse problema, essa realidade dos moradores de agora serem felizes e mais força a gente tem para mudar essa realidade.
EntĆ£o eu queria agradecer, gostei muito do papo, foi muito agradĆ”vel e Ć© isso. Imagina, eu que te agradeƧo. A gente volta a entrar em contato ali, se eu precisar de repente de alguma informação, de alguma outra apuração, eu posso mandar mensagem para vocĆŖ, tudo bem, a gente pode falar direto com vocĆŖ. Claro, pode falar comigo direto. E tambĆ©m vou te informando sobre a publicação a publicação da matĆ©ria, conforme ela for avanƧando. A ideia Ć© que ela saia no inĆcio de novembro, a expectativa nossa que a gente estĆ” trabalhando, a edição de outubro jĆ” estĆ” fechada, a gente agora que estĆ” trabalhando Ć© de novembro.
Mas na segunda quinzena de outubro Ć© possĆvel que jĆ” esteja no site para a edição da revista de novembro. Mas aĆ eu vou confirmando com vocĆŖ e atualizando. TĆ”, maravilha. Muito obrigado, mais uma vez, parabĆ©ns pelo trabalho de vocĆŖs, Ć© importante isso. Quero fazer circular mais essas informaƧƵes. Vamos, vamos sim. Valeu, imagina. Obrigado vocĆŖ pelo seu tempo, pela entrevista. Um abraƧo. Tchau, tchau. Um abraƧo, tchau, tchau.