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podcast completo Trabalho de vera (2)

podcast completo Trabalho de vera (2)

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The podcast discusses the reality of the quilombola population in the Maracujá community. The community faces challenges such as lack of healthcare and recreational spaces for young people. The Association of Residents is currently inactive due to lack of physical space. Education challenges for children include limited interaction with society. The community has benefited from being certified as a quilombola community, such as keeping the school open and faster access to social benefits. The community's name comes from the abundance of a plant called "maracujá de boi." The interview also features a pedagogue and writer who shares strategies to involve students and connect them to their roots through innovative pedagogical practices. No podcast de hoje, iremos falar sobre a realidade da população quilombola na comunidade do Maracujá. O Maracujá é uma comunidade negra rural localizada no município de Conceição do Coité, Bahia, a aproximadamente 18 quilômetros da sede do município, e apresenta características fitogeográficas semelhantes às encontradas em todo o território do Cisal. Deixando o asfalto da BA 120, que liga Conceição do Coité à cidade de Riachão de Aquipo, a comunidade quilombola do Maracujá foi uma das poucas do território do Cisal e a primeira a ser certificada pela Fundação Cultural Palmares. Pensando nesse e em tantos outros aspectos, surgiu o questionamento de que modo deu o percurso histórico e o processo de reconhecimento da comunidade quilombola do Maracujá em Conceição do Coité, Bahia. Nessa perspectiva, não poderíamos deixar de falar da comunidade sem ouvir as narrativas dos moradores desse lugar, que são memórias vivas e fazem parte de toda a estruturação dessa entrevista. Neste início da entrevista, vamos escutar a conversa conduzida com Vanusa, que nos deu a oportunidade de ouvir as perspectivas valiosas da comunidade do Maracujá ao seu olhar como moradora e mãe, onde foram destacadas várias questões e culturas históricas que serão compartilhadas durante a nossa entrevista. Quais são os principais desafios que a comunidade enfrenta atualmente? Estamos enfrentando uma falta de um posto de saúde. Nós tínhamos aqui um grande desafio na seca, que era a falta de água. Mas, graças a Deus, chegou para nós a água encanada, há seis meses atrás. E estamos com essa graça, pela misericórdia de Deus, lembraram da gente e nos deram de presente a água encanada. Então, hoje eu diria um posto de saúde e também um espaço de diversão. Um espaço para os jovens, adolescentes, bater papo, se distrair, tipo uma pracinha ou uma quadra poloesportiva, onde a juventude tivesse aonde liberar suas energias. Como a Associação de Moradores atua na comunidade do Maracujá? Olha, atualmente a Associação de Moradores está desatualizada. Quando aconteceu lá na pandemia, quando parou tudo, nós também paramos, como todo mundo. E quando todo mundo voltou, nós não voltamos. Por motivo que sempre tivemos aqui um desafio muito grande, que é o espaço. Não temos espaço para nada nesta comunidade. É um dos desafios que enfrentamos também. Cairia na primeira pergunta, mas foi bem lembrado. É um espaço físico para que possamos ter as nossas reuniões de associação, os movimentos religiosos também, que estão parados também, porque era tudo na escola e chegou a um ponto que não dava mais para ser. Tudo vai ficando atualizado e apertando a coisa mais. Então, começou a surgir responsabilidade e aí tudo parou. Então, desatualizaram tanto a associação como os movimentos religiosos. Quais são os desafios que você vê em relação à educação dos seus filhos na comunidade do Maracujá? Olha, essa questão não é preocupante a mim ainda. Eu ainda não vejo desafios na educação dos meus filhos vivendo nessa comunidade. Quanto à educação, tem a escola que vai aprender, a escola é para ensinar. Muitos pensam que é para educar, mas a educação vem de berço. Eu entendo, entendemos que vem de berço e devemos preparar nossos filhos para serem educados em todos os campos da vida, conviver na sociedade, no mundo religioso, no mundo da educação. Mas como meus filhos ainda são pequenos, a mais velha tem 12 anos, ainda não bate essa preocupação em mim quanto está nessa comunidade. Há desafios, sim. Há desafios, sim, porque são crianças, adolescentes que convivem pouco com a sociedade. Então, aí já é um desafio, porque quando a criança convive pouco com a sociedade, ela não tem o contato com a saúde, ela não tem o contato com a religião, ela não tem o contato com o futebol, ela não tem o contato com o social. Isso pode atrapalhar na educação dessa criança no futuro. Mas, se tratando de agora, não há essa preocupação ainda em mim. Há quanto tempo a senhora mora aqui na comunidade do Maracujá? Há 42 anos. Eu nasci e me criei aqui nessa comunidade. Graças a Deus, eu sou de berço aqui nessa comunidade. Quais benefícios positivos a comunidade passou a ter após o certificado de comunidade quilombola e como isso ajudou na educação do seu filho? Eu acho que só a escola, que conseguimos mantê-la aqui em aberto, porque várias comunidades fecharam as escolas. E nesse tempo, porque eu não lembro muito bem o ano, teve-se uma luta também para fechar a nossa, o único bem que a gente tinha e que temos é a escola. E aí, a gente também teve que lutar com as nossas armas. E a arma que nós tínhamos na mão foi o cerquilombo. E aí, por ser quilombolas, não fecharam. Então, se não fosse, tinha fechado. Então, é um ponto positivo. E também a questão dos benefícios. Os benefícios, quando a gente cadastra, seja lá qual benefício for, benefício social, que a gente coloca lá da identificação de quilombolas, tem aquela rapidez, tem aquela preocupação do governo. Então, também é positividade, são pontos positivos. Tem pessoas que fazem um cadastro, alguma questão, recorre a alguma questão na justiça, por ser quilombola, também consegue com mais facilidade. Então, são pontos positivos. Olha, o nome, segundo os antepassados, é por causa da planta. O que mais encontraram aqui foi o maracujá de boi, o chamado maracujá de boi, aquela ramagem. Encontraram bastante quando começaram a roçar aqui o terreno. E aí deram-se esse nome, por esse motivo. E quanto à fundação, eles também, os antepassados também contavam que fundou-se com quatro irmãos. Chegaram para roçar esses irmãos, eles vieram, segundo eles, vieram da comunidade da vazante, próximo daqui também, fica entre Canção e Maracujá, vinheiro da vazante. E nessa caminhada encontraram aqui essas terras e resolveram roçar e construir suas primeiras casinhas. Que foram os quatro irmãos Zé de Souza, Severino de Souza, Calixto de Souza e Gregório de Souza e suas esposas. Uma mudança geral, é uma nova escola. E não sei se vai ser possível, mas eu ainda sonho em ver essa escola cair por terra e ser construída uma nova escola quilombro. Com a identidade da comunidade. Esse é um, eu não sei se é o sonho de todos, mas é o meu. De ver uma construção de uma nova escola, um novo espaço escolar com a identidade. E quanto ao conteúdo, trouxesse um, trabalhasse mais nessa, nesse ser quilombolas, nessa educação quilombolas. E até mesmo os professores, quanto a atuação dos professores em sala de aula, direção, funcionário, optasse por professores negro, direção negra, funcionário negro. Sabe? Para que o aluno se identificasse ali, para que o aluno ganhasse força. Para que o aluno se visse dentro da sua própria casa e tivesse essa vontade de querer também ser como aquele professor, como aquele diretor, como aquele funcionário. É isso. Nada contra professores brancos, é muito pelo contrário, estamos falando aqui de identidade. Nessa próxima fase da entrevista, teremos a oportunidade de dialogar com a escritora e pedagoga Rayane Cordeiro, que compartilhará sobre suas obras relacionadas à cultura do quilombo da comunidade do Maracujá, além de elaborar as questões educacionais dessa localidade. Boa tarde, Rayane. Desde já agradecemos pela sua presença, como eu falei, é uma honra para a gente estar aqui, lhe entrevistando, entrevistar uma escritora regional, uma pessoa que escreve sobre a comunidade quilombola, e é honroso para a gente que está apresentando um podcast para falar sobre o quilombo de Conceição do Coité. A primeira pergunta que eu vou fazer é se você poderia contar para a gente alguma história pessoal e quais estratégias pedagógicas inovadoras são usadas para envolver os alunos e mantê-los conectados com suas raízes. Bom, na verdade assim, sempre me perguntam o porquê que eu resolvi escrever sobre o quilombo do Maracujá. Em 2019 eu passei num concurso público e eu tinha a opção de trabalhar ou em Juazeirinho ou no Maracujá, e eu conheci o quilombo do Maracujá na graduação. Eu estava acho que no terceiro ou quarto semestre de pedagogia, a gente foi fazer um trabalho tipo esse que vocês estão fazendo, e aí quando eu conheci o quilombo eu me apaixonei. Terminei a graduação, mas sempre com aquela vontade de voltar lá, e aí com essa oportunidade do concurso eu escolhi logo ir para o Maracujá. Então eu comecei minha prática como professora lá em 2019 e eu fui surpreendida pelo fato de ser uma comunidade quilombola, de ser uma escola localizada no quilombo, mas ter os materiais didáticos como se fosse uma escola comum. E assim, a sala que eu trabalhava tinha uma quantidade muito grande de livros paradidáticos, de leitura, que foi algo que eu sempre gostei muito de fazer com as crianças. Só que o que eu percebi é que eram leituras com protagonistas brancos. Então isso me chamou atenção, porque eu acreditava que aquelas crianças precisavam se enxergar nos materiais didáticos, nos materiais paradidáticos, para elas se reconhecerem, enquanto pessoas negras, valorizarem a sua cultura, valorizarem o seu local. Então tudo começou daí, da minha prática enquanto professora, da ausência desse material, desses materiais didáticos e paradidáticos com protagonistas negros. Nesse mesmo ano eu passei no mestrado em Serrinha, na Uneve de Serrinha, e como eu fiz o mestrado profissional, precisava ter, além do TCC, um produto. Poderia ser uma formação, um material didático, e eu resolvi utilizar a questão da história da comunidade para falar um pouco sobre aquele lugar, sobre aquelas crianças. E a partir disso eu já comecei, eu não diria com práticas inovadoras na sala de aula, mas com práticas que fizessem aquelas crianças se valorizarem, se enxergarem. Então eu comecei a utilizar muitas dinâmicas voltadas para essa questão da valorização, da cor da pele. Levei várias histórias infantis, comecei a comprar livros, a baixar na internet, livros de histórias infantis que falavam sobre a cor da pele, e aí pedia para eles fazerem pinturas. No início eles tinham uma resistência grande, porque eles queriam utilizar o lápis bege, que era o lápis que eles sempre chamavam de lápis cor da pele. E aí eu comecei a questionar com eles, cor de qual pele? Porque aqui na sala a gente tem uma variedade muito grande de tons de pele. Então assim, fui trabalhando com eles essas questões. Nada inovador, mas necessário para justamente valorizar, resgatar. E não foi um trabalho que foi fácil, foi rápido. Eu ainda estou nesse trabalho, desde 2019 que eu estou com essas crianças. Elas eram grupo 4 e 5. Hoje elas já são quarto ano e quinto ano. E a gente continua esse processo. Volto e meia eles falam para o lápis cor da pele, eu falo qual pele? E aí eles falam, não, lápis bege. Então é um processo que é por muitos anos. A gente precisa estar sempre trazendo esse resgate para a sala de aula, contando a história diferente daquela que nos é contada pelos livros didáticos, porque a gente sabe que a gente tem uma escolarização totalmente europeizada. Então a gente precisa transpor isso, passar por essa etapa, que não é fácil, para a gente desconstruir. A gente passou a nossa vida inteira escutando sobre as questões voltadas para a forma como o Brasil foi colonizado, e hoje a gente sabe que não é bem daquele jeito. Então é um papel difícil da gente estar mudando na forma das crianças pensarem, mas é extremamente necessário. E a gente tem que fazer isso na base, enquanto eles são pequenos, para quando eles crescerem eles terem um pensamento diferente do que aconteceu com a gente. Porque para mudar enquanto adulto já é mais difícil. Algo que te motivou a escrever mais sobre o quilombo, além do que você falou para a gente aqui agora, algo que te motivou mesmo a falar assim, olha, eu vou escrever sobre o quilombo do Maracujá. Acredito que a minha vivência com a comunidade, pela forma como eu fui acolhida, pela forma como as pessoas lá me tratavam, a gente tem uma relação muito forte lá com as avós, com os avôs. Eles estão sempre presentes na criação das crianças, então vão levar a escola, vão buscar. Então eu sempre fui muito bem acolhida. E quando eu comecei a fazer o mestrado, eu senti uma ausência de um material didático, ou paradidático, que contasse a história para as crianças. A gente tem muita coisa produzida, e também é algo típico de comunidades quilombolas a questão da oralidade, mas o que a gente tem percebido é que as pessoas mais velhas estão morrendo e essas tradições, essas histórias, muitas vezes elas não são perpetuadas pelos mais jovens. Então eu achei interessante, a partir da minha pesquisa, que eu escutei, fiz entrevista com as idosas do quilombo, com os professores da escola, com líderes da comunidade. Então eu achei interessante colocar essa história no papel de uma forma que a gente pudesse utilizar na escola. E é um livro, eu costumo dizer que é um livro que, apesar de ser um livro infantil, ele conta uma história verdadeira. Então a gente pode trabalhar com todas as idades. O que vai mudar é a forma como a gente vai falar para o público, porque quando é um público infantil você tem que ter uma linguagem direcionada para a criança. É um público adulto, o foco muda. Então a minha maior motivação foi o dia a dia com eles, a convivência com as crianças, o fato de perceberem que eles precisavam fazer esse resgate da cultura. É algo que a escola está tentando mudar. A gente não está nem perto do que deve ser, mas a gente já avançou muito se a gente comparar 2019 para cá. Bom, quais são os maiores desafios que você enfrentou em escrever sobre a comunidade do Maracujá? Na verdade, eu não considero que eu tive nenhum desafio, muito pelo contrário, para mim foi muito prazeroso, porque a história surgiu da escuta das crianças, do dia a dia das crianças, das entrevistas, e as personagens dos livros, desse primeiro livro no caso, a vovó do livro, ela representa todas as avós que eu entrevistei. Então eu transformei ela em uma personagem fictícia, mas que traz a personalidade de todas ali. Então eu trouxe as falas de todas. É um livro que foi, eu posso dizer para você, que foi feito junto com as crianças, que foi feito junto com a comunidade. Então eu não tive desafio, eles me abraçaram, ficaram muito felizes quando eu disse que eu ia trazer uma história, que eles iam aparecer, e de fato eu tirei foto das crianças e pedi para a ilustradora que fizesse os personagens das ilustrações parecidos com eles, para que quando eles recebessem os livros, o livro porque eles ganharam, eles olhassem e dissessem assim, pró, sou eu, e isso de fato aconteceu. Eles perguntavam, isso daqui é fulano? Aí eu dizia, não sei, mas parece. Então até hoje eles de fato não sabem se é realmente aquela criança ou não, mas eles conseguem ver traços. Eles fazem uma alusão, dizendo que parece o coleguinha tal. Então é isso que para mim foi o mais gratificante. Eu não tive desafio, muito pelo contrário, eu tive muita ajuda. Eu escrevi junto com eles. Interessante, né? Bom, quais são os principais temas que você aborda nesses livros? Então, eu tenho hoje três livros publicados, e os três eles tratam de questões regionais. O primeiro, que é a riqueza do lugar, que fala sobre a história da comunidade do Quilombo do Maracujá. O segundo, que é sobre a Orquestra Santo Antônio, que é os diferentes sons do Quilombo. Porque assim como o pessoal da orquestra, quando a gente começa a escrever, quando a gente se destaca em alguma coisa na nossa cidade, a gente percebe um não reconhecimento. Às vezes quem é de fora reconhece a gente mais do que as pessoas da nossa própria cidade. Então eu senti que eles também passavam por isso. Uma orquestra que é conhecida internacionalmente, mas que muitas vezes tem concerto e a gente não vai. A gente não se move a trazer para um momento cultural. Eu vejo muito pouco isso. Então eu achei interessante fazer isso. E esse segundo livro, eles receberam 5% de toda a venda do livro, como uma forma de ajudar. Porque foi justamente no período da pandemia, não estava tendo editais. Então eu pensei, de alguma forma vai me ajudar na divulgação, eles vão ser ajudados com a questão da venda do livro. Então o pensamento foi esse. E o terceiro, que é o mais recente, Árvore que Virou Cidade, eu diria que fechou essa trilogia regional. Porque ele conta a história do surgimento de Coité, também com a linguagem voltada para o público infantil. Porque a gente já tem livros publicados, só que mais para um público adolescente, um público adulto. E muitas vezes, enquanto professora, eu tinha dificuldade de trazer essa história para os meus alunos. E tudo que eu faço, tudo que eu escrevo, é pensando neles, em como eu vou trazer isso para eles. E esse terceiro livro, além de ele falar sobre o surgimento da cidade de Coité, ele traz também um pouco sobre a questão da religiosidade, da importância de a gente valorizar e conhecer todas as religiões, respeitar, porque a gente tem percebido muitas questões hoje voltadas para a intolerância religiosa. E principalmente em comunidades quilombolas, que a gente vê que muitas vezes a cultura está se perdendo, porque as pessoas têm medo de se manifestarem, principalmente com relação à questão da religião. Então, eu achei interessante trazer. Então, os três livros trazem histórias verdadeiras, que aconteceram, porém voltadas para um público infantil, com a linguagem mais infantil. Como você vê o papel da escrita na luta por direitos e reconhecimento da comunidade? Eu acho que até já respondi um pouquinho dessa pergunta. Eu acredito que esses livros vão servir como documentos de emancipação para essas crianças, e é também uma forma de incentivá-las a ler e a escrever. Porque às vezes, quando a gente não está nesse universo, a gente acha que é muito difícil escrever um livro. O difícil não é escrever, o difícil é publicar, que é caro, mas escrever não é difícil. Mas um dia desses, uma aluna me perguntou assim, Prol, por que a senhora escreve só sobre a gente? Falei, porque vocês fazem parte da minha vida, vocês são a minha segunda família. Parece uma coisa que a gente fala, clichê, mas não é. Se a gente for fazer as contas, a gente passa muito mais tempo com eles, muitas vezes, do que com a própria família. Então, não ia servir para mim falar sobre outro lugar, não ser do lugar que eu estou, do lugar que me acolheu. Então, é uma forma de fazer com que eles se enxerguem ali, se valorizem, se motivem a escrever, se motivem a estudar. Porque eu sempre digo para eles que só através do estudo é que eles vão conseguir mudar de vida, ser alguém na vida, possam ir para a comunidade, posto de saúde, porque lá a gente não tem esse serviço. E tantos outros, para ser até uma forma de que eles possam ficar na comunidade. Bom, essa também a gente achou bastante interessante, porque quais autores ou escritores influenciaram a sua abordagem para escrever sobre o maracujá? Então, antes de eu começar a escrever sobre o maracujá, propriamente dito, eu precisei estudar sobre essas questões de educações antirracistas, porque até então era uma novidade para mim. E eu tive a oportunidade de dizer isso pessoalmente a ela, me orgulho muito, porque é uma pessoa muito simples, que foi Djamila Ribeiro. Djamila Ribeiro, com o livro Pequeno Manual Antirracista e O Lugar de Fala, é como se ela estivesse dizendo para mim que, apesar de ser uma mulher branca, eu poderia escrever sobre essas temáticas, porque até então eu me sentia meio que deslocada, eu achava que eu não podia. Por que uma mulher branca vai falar sobre uma temática, sobre uma educação antirracial, sobre uma educação antirracista? Eu ficava muito confusa, muito aflita. E quando eu lia esses dois livros, ela fala muito claramente que todos nós temos um lugar de fala. O que no meu caso eu não tenho é a representatividade da cor preta. Eu nunca, por exemplo, vou passar por uma situação de preconceito, então eu não vou poder falar dessa situação do racismo propriamente dito. Mas eu posso, enquanto professora, fazer esse papel na escola de ajudar essas crianças a conhecerem a sua verdadeira história. Então, assim, eu acho que a minha maior referência é de Jamila Ribeiro. Tiveram inúmeras outras. Eu li artigos da professora Iris Verena daqui do campus, li a dissertação, a tese de doutorado da professora Lúcia Parceiro, que é também aqui do departamento, não sei se ela continua como professora, e ela fala já mais especificamente do Maracujá. Então, foi um trabalho que me ajudou muito. Mas foi muita gente. Nilma Lino Gomes. Mas eu acho que de Jamila foi, assim, quem me norteou e disse pra mim você pode falar, mesmo sendo uma mulher branca. Depois que eu li aquele livro dela, principalmente o lugar de fala, é como se tivesse tirado um véu, sabe, dos meus olhos, e eu consegui escrever. Porque até então eu queria, mas eu não sabia por onde começar. Então eu acredito que ela e Iris Verena, com artigos que eu li dela também, e a professora Lúcia. Obrigada. Bom, essa é a última pergunta. Sabemos que você é professora da comunidade de Maracujá, e nós gostaríamos de saber como os alunos reagem a saber que sua professora aborda temas relacionados à sua própria cultura escrita, e se você percebe se eles se sentem representados nos seus livros e nas suas obras. Eu acredito que sim, eles se sentem. Porque, como eu falei anteriormente, todas as ilustrações de todos os livros são baseadas nas crianças da escola. Eu não trago a fotografia deles, porque isso aí envolveria uma questão voltada para autorização, que seria muito complicado, mas é como se fosse uma caricatura. Então essa caricatura faz com que eles se enxerguem de fato. Eles já conseguem perceber que existem protagonistas negros, existem reis e rainhas que podem ser negros, porque até então, na cabeça deles eram príncipes e princesas, reis e rainhas, brancos, loiros, dos olhos azuis ou verdes. Então, assim, isso a gente já consegue perceber de forma muito notória. E o que acontece? Nas pinturas, por exemplo, eles adoram pintar. Eles são 3º, 4º, 5º ano, mas eles amam pintar. Então eles já naturalizaram utilizar o lápis marrom, utilizar o lápis preto. Antes teve situações que eu precisei tirar o lápis beige, porque tudo eles queriam pintar da cor beige. Teve uma situação, por exemplo, que eu pedi que eles representassem a vovô. O vovô e a vovô. Porque como são pessoas que estão muito presentes, foi uma data que eu achei interessante marcar. Lá em 2019, eu falei, eu quero que vocês pintem o vovô e a vovô da cor que eles são. Eu frisei isso bastante. Aí eu levei aquela pintura preta e branca para eles colorirem. E eu tinha 12 crianças na sala. Das 12, duas pintaram os avós com a cor preta ou marrom. Todos os outros 10 pintaram com a cor beige. E aí eu fui e falei, mas a vovó de vocês é da cor da frou? E aí eles não souberam me responder. Estava tão naturalizado para eles aquela cor que era automático. Como eu já sabia que isso poderia acontecer, eu já tinha levado a quantidade de cópias a mais. Falei, a gente vai pintar agora a vovô e o vovô da cor que eles são. E aí eu comecei pintando com eles. Vou pintar um pouquinho aqui e você termina. E aí pronto. A partir daquilo ali, eles já começaram a mudar a forma de enxergar. E isso nada mais é do que o que eles enxergam na televisão, nos livros, na escola, nos cartazes. Então a gente precisa mudar isso. E é como eu falei, não é simples, não é rápido, mas a gente consegue. Porque hoje essas crianças que eram lá grupo 4 e 5, e hoje são quarto e quinto ano, eu não preciso mais falar, oh, vocês vão pintar da cor que eles são. Naturalmente eles já fazem isso. Uma coisa que eu sempre faço com eles, que eles adoram, é eu levo um livro, todos os livros, 99% dos livros que eu leio, pra ler pra eles, são livros com protagonistas negros. Eu faço isso ao longo do ano todo, não só no novembro, porque eu acho que é uma outra coisa que a gente precisa também eliminar. Não só falar no novembro. O novembro a gente tem que marcar, é importante. Mas tem que ser falado o ano inteiro. E é o que eu busco fazer. Aí eu sempre faço a leitura do livro e utilizo um aplicativo pra pegar a imagem do próprio livro e colocar em preto e branco e peço pra eles colorirem. E aí eles fazem utilizando as cores que realmente são os personagens. Tem personagens que tem a cor já mais retinta, então eles pintam mais forte. Quando tem uma corzinha mais clara, eles já pintam um pouquinho mais claro, usam marrom mais clarinho. Então eles já conseguem perceber a variedade dos tons de pele. E isso sem eu precisar marcar. Façam assim, já é natural. Então dá pra perceber que o trabalho tá funcionando, tá fluindo. E a gente tem apoio também das outras professoras da escola que tem esse mesmo pensamento. A gente consegue seguir essa linha e aí o trabalho vai fluindo. Bom, nós agradecemos pela sua presença. Como eu falei no início, nós estamos honrados. E pra finalizar, tem alguma frase que você quer deixar marcado nesse podcast? Eu acho que a frase que eu mais falo pros meus alunos é que só através do estudo que eles vão poder transformar a sua vida. Disciplina, comunicação e realidade brasileira e regional abordando o tema A Realidade da População Vilambola na Comunidade do Maracujá. Contando com as vozes das comunicadoras Vanessa Lohana, Franciele Santos, Keila Silva e Edivando Lima. E com as entrevistadas Vanusa, Rayane Cordeiro, Roteiro, Cailane Garcia. Edição de áudio também foi realizada por Cailane Garcia. Legendas pela comunidade Amara.org

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