Ei, meu irmão, se liga. Estamos no barraço, aqui é um assalto. Passa logo o grana, senão tu vai levar chupo quente nos corno. Anda logo! Quem leva chupo em nada é seu pedaço de tica. Eu sou deputado, eu tenho imunidade. Passa o dinheiro, vagarzinho. Dinheiro é coisa que daqui não vai. Dinheiro vem. Quem não vai, bora logo, mas eu não sou no seu. Toma no pão, garoto. Toma em seu que vai, meu irmão, não facilita não.
Eu sou ladrão, compadre. Ladrão sou eu. Você ainda estÔ no jardim de fãs. Ladrão pra mim é que é rouba de milhão pra cima e fica solto como eu tÓ. Quer que eu dê um salneco, deputado? Ai, meu irmão, eu preciso só de um dinheirinho pra comer. O que que hÔ? Faltam mais de quatro dias que eu não boto nada na barriga. Ai, serÔ por ser que no pobre não tem outro assunto? Ou seja, esse é fome, fome, fome, fome, fome, fome.
Por isso eu só gosto de coexar com quem domina os meus assuntos. Mamatas, negociado. Mordomias, imunidade, roubalheira descarada. Pré-potência, usurpação, falta de carÔter, sombra e Ôgua fria. Mas por que quer assaltar logo, deputado? Ai, meu irmão, porque tem que assaltar quem é rico, não é não? Relativo, relativo, relativo. Tem que assaltar quem é pobre. Não hÔ, nesse mundo inteiro, alguém que possa ser mais assaltÔvel do que pobre. à pra isso que pobre existe. Não tÔ com fome? Assalta o pobre.
Mas pobre não tem grana, como é que é? A marmita, a marmita. Não tÔ com fome? Chega perto, pega a marmita aqui. JÔ viu rico carregando marmita na rua? Vi não. E por que você acha que os ricos são ricos? Porque eles roubam. Sinceramente. Mas roubam de quem? Dos ricos. Não. Dos pobres. E a prova? Ninguém quer ser prefeito pra quê? Pra arrumar cidade? à pra se arrumar. Rico, além do mais, tem esquema. Na indústria, por exemplo.
Faz um aparelho por quatro. Vende por oitenta. E no crediĆ”rio cobra trezentos. E quem Ć© que entra nele? Rico. Pobre. Que compra. E daĆ eu fico achando que isso Ć© um grande negócio. Pobre Ć© tĆ£o otĆ”rio. Que ainda compra casa pela caixa econĆ“mica. A casa custa quarenta. Quando ele paga duzentos e vinte, vai ver quanto Ć© que tĆ” de renda. TĆ” de renda trezentos e noventa. Ć, meu tio. Rico quer rico, nĆ£o usa crediĆ”rio, nĆ£o Ć© nĆ£o? Por essas outras coisas.
Ć que eu quero que pobre se exploda. AĆ, meu tio. JĆ” vi que tu odeia pobre, nĆ©? Eu odeio de modo geral. A palavra pobre. A pessoa em si. A posição social. E as ideias. Gaston. Toma essa arma aĆ. Espera, meu irmĆ£o. AĆ. Espera. Espera. AĆ, meu irmĆ£o. Devolve esse revólver, pĆ“. DĆ”-me o ladrĆ£o. VocĆŖ falou que eu sou o Ćŗnico. Falei que tu Ć© o ladrĆ£o. Gaston. Devolve a arma. Porque ele me reconheceu. Deve ser eleito.